quarta-feira, setembro 24, 2003

Depois de a História ter acabado

Uma característica das correntes ideológicas dominantes dos séculos XIX e XX era o seu rigor formal. Espartilhadas por princípios razoavelmente rígidos (embora com variantes, mas também essas rígidas dentro dos seus próprios pressupostos) o seu estudo e análise era relativamente simples (não porque fossem conceitos simples – que normalmente não eram – mas porque existia essa tal formalidade que facilitava o estudo).
As ‘velhas’ ideologias caíram, vítimas inevitáveis do progresso e da evolução do pensamento. As ‘novas’ ideologias, que as estão a substituir, apresentam uma maior fluidez formal e conceptual.
Algumas dessas novas ideologias são ‘versões simplificadas’ das grandes correntes dos dois séculos anteriores. As novas versões do liberalismo económico – parentes pobres e tecnocráticos do liberalismo construído no século XIX e no início do século XX – não prevêem muito mais do que o direito fazer negócios com todos em todo o lado – vulgo globalização – apoiadas em vagos conceitos democráticos, qualquer coisa como o direito dos povos a governarem-se a eles próprios, mas concluindo sempre que esses governos têm que ser concordantes com as suas próprias ideias sob pena de não serem ‘verdadeiramente’ democráticos.
As versões simplificadas do socialismo, presentes em muitos dos movimentos contrários ao fenómeno da globalização, acabam por ser mais movimentos a contrario do que afirmativos. Não que não tenham propostas, note-se, mas porque a sua génese acabou por ser uma espécie de reacção ‘epidermica’ às propostas neo-liberais da globalização.
Para além destas, temos uma miríade de propostas extremistas de direita, numa franja creio que negligenciável das sociedades ocidentais, que têm algum impacto pelo mediatismo das suas acções e não pela sua verdadeira representatividade social e têm normalmente mais pressupostos racistas e menos pressupostos políticos.
Finalmente, a questão dos fundamentalismos. Quanto a mim, a área de análise política mais interessante da actualidade e que marcará as primeiras décadas deste novo século.
Os fundamentalismos, nomeadamente religiosos, apresentam-se como campo fértil de propostas sociais e políticas, com um enquadramento ‘ideológico’ sui generis, porque deficilmente susceptível de debate: os princípios religiosos. Ora a religião é dificilmente racionalizavel – como de resto tudo aquilo que depende da fé – o que torna toda esta questão mais interessante. As correntes ideológicas do século XXI, mais do que campos de batalha intelectual, serão terreno fértil à justificação de conflitos reais entre comunidades, estaduais ou não, que terão sempre razão porque as suas propostas sociais e políticas serão sempre as melhores na medida em que terão uma fundamentação ‘superior’.
Avizinham-se tempos interessantes ...
AR

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