quinta-feira, março 31, 2005

dedicado à Sofia


"Sweetness, sweetness I was only joking
When I said I’d like to smash every tooth
In your head

Oh ... sweetness, sweetness, I was only joking
When I said by rights you should be
Bludgeoned in your bed."

The Smiths, Bigmouth Strikes Again
LR

Elemento I - Dor (2)

Ngaga (lê-se Ne-gá-gá) poderia ser um jovem como qualquer outro. Quando o conheci, em Dezembro de 2003, tinha abandonado a Universidade no final do 1º ano (estudava engenharia - não sei qual) e estava desempregado. Até aqui nada de extraordinário.
A não ser o facto de Ngaga ter, à data, 24 ou 25 anos e viver em Yaoundé, nos Camarões. O ordenado mínimo no país rondava os 25.000 francos CFA o que equivaleria a perto de 40€ ao câmbio do mercado negro. O país tinha um desemprego de cerca de 50% e um crescimento populacional explosivo. Ngaga tinha abandonado os estudos porque o pai morrera (já não tinha mãe) e não tinha possibilidade de arranjar emprego, sem formação e num país com tão alta taxa de desemprego, pelo que não poderia pagar os seus estudos. Tinha um irmão, que vivia em França, onde tocava num qualquer grupo que actuava em bares. Ngaga não conseguira visto para se juntar ao irmão. Na prática, Ngaga não tinha futuro.
A última vez que soube dele estava em N'Djamena, onde tinha chegado na esperança de conseguir um visto para entrar na União Europeia. Julgo que a sua ideia era vir para Portugal. Mas pelo que soube estava praticamente sem dinheiro e a possibilidade de conseguir um visto era ... bem ... remota. Pelo tempo que passou, e sem mais notícias, posso assumir que Ngaga não conseguiu o visto. E terá gasto na aventura o pouco que ganhou no stand português numa feira realizada em Yaoundé. Ngaga ganhou, nessa semana, cerca de 70.000 francos CFA. Julgo que foi com esse dinheiro que terá conseguido viajar até N'Djamena.
Ocorrem-me, frequentemente, as conversas tidas naqueles dias com Ngaga. A sua vontade de saír dos Camarões, de vir para a Europa trabalhar no que quer que fosse e, quem sabe, talvez um dia conseguir estudar cá e tirar o seu curso de engenharia. Ngaga tinha esperança. E como é forte a esperança dos desesperados.
Só posso romancear sobre o que entretanto lhe terá acontecido. Talvez a sua esperança o tenha levado a, com outros desesperados, atravessar o Sahara e, depois, a lançar-se na aventura da travessia do Mediterrâneo. Talvez o tenha feito e tenha morrido à vista das costas salvíficas da Europa. Talvez tenha morrido na travessia do deserto. Talvez tenha conseguido chegar a Espanha. Talvez tenha retornado a Yaoundé. Talvez ainda esteja em N'Djamena. Ou talvez tenha morrido de uma qualquer doença de entre a miríade que matam, todos os dias, em África.
Se for vivo, Ngaga terá hoje 26 ou 27 anos. Mas continua a não ter futuro.
AR

Pequena heresia matinal

Ontem perante a (grande) notícia que a tara musical de todo o trintão que se preze será tema de simpósio universitário de 2 dias (não tanto como a Madonna que tem direito a uma cadeira anual, ou mesmo os nossos Xutos que já foram tema de tese de mestrado) fiquei embasbacada a olhar a foto do Morrissey. Esta cara não me é estranha .... Depois de uma observação cuidada do seu beicinho, do nariz abatatado, desse olhito azul brilhante, cheguei à seguinte epifania:




E se esta tanga funcionasse melhor iria em tempo útil.
Sofia

PS: Começo a desconfiar que estou mesmo a praticar heresia porque o blogger não me deixa postar isto. Morrissey is watching me.

comei-vos uns aos outros


Vargtimmen (1968), de Ingmar Bergman
LR

quarta-feira, março 30, 2005

learn to love them, assemble the ways


"They looked like nobody else and sounded like nobody else, and their music had an emotional depth that moved people in a way that no band has managed before or since."
LR

segunda-feira, março 28, 2005

Isto é arte

Advertência: O post que segue esta advertência não se enquadra na estrutura moral da Quinta Coluna, pelo que a esta não poderá ser assacada qualquer responsabilidade pelo conteúdo do dito post. O facto de ter sido o AR a escrevê-lo não permite que lhe seja assacada qualquer responsabilidade pelo mesmo, até porque ele negará sempre e veementemente a sua autoria. Para terminar, o post que se segue a esta advertência não deve ser lido por pessoas de idade inferior a 18 anos, pessoas de bem, virgens, virgens púdicas, virgens púdicos, moralistas e outras pessoas de elevada (ou não) craveira moral.

No Sábado passado teve lugar em Lisboa, na Aula Magna, o Concerto do Ano. Responsáveis: Ena Pá 2000. Pois.
Sala cheia e concerto com qualquer coisa como 30 minutos de atraso. Pouco, acho eu, embora a minha experiência nestas andanças seja bastante pequena. O público, em delírio, cruzava qualquer coisa como duas gerações e meia, mais ao menos dos 18 aos 50. Fiquei satisfeito. Ainda estou a meio da tabela!
E depois, meus amigos, foi o desenrolar de alguns clássicos intemporais: Puta, Rap Alentejano, Vida de Cão, devidamente acompanhados pela plateia, por esta altura em delírio também por causa do alcool e dos charros. Aos clássicos juntaram-se algumas novidades (pelo menos para mim), como o brilhante "Punheta ao Amanhecer", baseado num original de Carlos do Carmo e dedicado a esse brilhante artista da nossa praça. Como a veia poética dos moços é forte!
Perto do final, já o grande 'Manel' andava de rastos no palco, evidentemente bêbedo - passou o espectáculo inteiro a beber, claro - entre as enormes colunas que largavam sobre nós potentíssimos decibéis. Enganou-se numa canção, espetou com as pautas no meio do chão, largou uns sonoros 'foda-se, caralho' , falou várias vezes em Santana Lopes, embora a partir de determinada altura lhe chamasse 'Senhor Sousa Lopes' e, quando saí, em plenos encores onde se cantava o velhinho Bacamarte, para evitar a confusão da saída, já a balburdia era completa no palco!
Ah, artistas!
AR

É tudo uma questão de perspectiva caro LR





Ainda com o excelente Martin Parr.
Por acaso tenho lá um foto/livro dele lá em casa, o Common People (sense! common sense!Tenho seguido com algum interesse o mega debate Common People vs. Babies mesmo que os Pulp não me suscitem grandes ardores e ó depois dá nisto).

Sofia


My way (versão Sid Vicious)




Martin Parr

Sofia

Darwin, esse herege

Tudo o que aprenderam no liceu estava errado.
LR

domingo, março 27, 2005

and now for something completely different

Na Quinta das Celebridades, Lili Caneças pediu um minuto de silêncio pela morte de Jesus Cristo.
LR

sagrada família

Páscoa do Senhor também é dia da família.
CC

sexta-feira, março 25, 2005

cada coisa a seu tempo

Na ânsia de refutar a interpretação histórica dos Evangelhos, o Tiago dá saltos no tempo. O sepulcro só ficou vazio depois de lá ter sido sepultado um corpo.
CC

quinta-feira, março 24, 2005

contradiction in terms





a)Tu disseste "tenho que começar a educação de Sofia"
Eu disse "não podes, isso é uma contradição de termos."

b) Tu disseste "agora procuro o desígnio da vida. às vezes penso encontrá-lo num bater de asas, num murmúrio trazido pelo vento, no piscar de um néon. escrevo páginas e páginas a tentar formalizá-lo. depois queimo tudo e prossigo a minha busca"
Eu disse "eu não faço nada. fico horas a olhar para uma mancha na parede"

A b) por acaso é falsa e parte da letra de Tu disseste dos Mão Morta (note-se o realismo da cena). A a) esperei anos para poder dizer-la.

Sofia

quarta-feira, março 23, 2005

pensamento do dia

No século XXI, dizer "só às paredes confesso" perdeu o impacto: o pladur não tem a espessura filosófica da alvenaria.
LR

O argumento pascal

Pesons le gain & la perte en prenant le party de croire que Dieu est. Si vous gagnez, vous gagnez tout ; si vous perdez, vous ne perdez rien. Pariez donc qu'il est sans hesiter.

Blaise Pascal, Les Pensées

Post inspirado pelo Rohmer. Hoje passa o Le genou de Claire na Cinemateca.




Sofia

mocidade, porque fugiste de mim?


Já tem um ano, eu sei. Mas nunca tive o culto da "novidade" (muito pelo contrário) e continuo a ouvi-lo diariamente. E tem lá dentro esta música, que fala do Steve McQueen e da cadelinha Laika...

Absent Friends

Absent friends, here's to them
And happy days, we thought that they would never end.
Here's to absent friends.

Little Jean Seberg seemed
So full of life, but in those eyes such troubled dreams.
Poor little Jean.

Woodbine Willie couldn't rest until he'd
Given every bloke a final smoke before the killing.
Old Woodbine Willie.

Steve McQueen jumped the first one clean

But the great escape he'd tried to make was not to be.
Maybe next time Steve.

Laika flew through inky blue

'Til Laika neared the atmosphere and Laika knew
Laika's life was through.

Oscar Wilde was a lonely child.
He fought and won acceptance from the world.
They smiled, they laughed, they praised,
They drove poor Oscar to his grave.

Absent friends, here's to them,
And happy days, we thought that they would never end,
But they always end.
Raise your glasses then to absent friends.


LR

You've got a killer scene there man

Os gajos que se autodenominam por QOTSA (y hay que ternerlos por serem conhecidos por queens) editaram ontem um novo álbum. Chama-se Lullubies to paralyze (que me parece um bom título para uma próxima participação nos Fantasporto) e está na prateleira de rock psicadélico. Talvez na FNAC o encontrem em metal, ou alternativa , o cesto para onde vai tudo o que eles não têm pachorra de classificar.Isso não interessa, óbvio, interessa que é viciante, que está bem feito, que o "Tangled up in plaid " é para pôr em repeat. Contínuo (só para reforçar embora seja uma redundância).




Ah! e os Pixies vão mesmo voltar a Portugal para o Paredes de Coura. Certo que é apenas a enorme nostalgia que nos levará ali. FB e amigos estão claramente a engordar a sua conta bancária com este suposto regresso, até agora estéril de novos trabalhos e farto em concertos esgotados. Mas eu gosto deles na mesma.E assim se encerra mais uma sessão digest de música no seu AQC. E vivam os acrónimos!
Sofia

Elemento I - Dor

A dor é fundamental nas nossas vidas. Seriam vazias sem ela. Os nossos objectivos, os nossos anseios, as nossas aspirações estão intimamente ligadas à dor. Escutamos a nossa dor nas noites em que o silêncio nos grita da sua quietude. Ansiamos pela sua presença na confusão perdida dos dias. Desesperamos se não a sentimos, se não temos o seu ombro. Apoiamo-nos nela para prosseguirmos. Não conseguimos viver sem o rugido de fundo dos que têm fome, dos que são levados por males mais velhos do que a humanidade, dos que desesperam nos seus dias sem esperança. A dor é vida. É seguir em frente. A dor é sofrimento e alegria, esperança e desespero. É a nossa morte em vida e a nossa espectativa de vida na morte. Sem dor nada mais seriamos que carcaças vagueantes na infinidade dos dias que vivemos.
AR

pelo menos é semana

Semana Santa na Terra.
CC

a vida, o Alentejo e tudo o mais

O Pedro prometeu e cumpriu.
LR

terça-feira, março 22, 2005

só não sei porque não fiquei em casa

Parara de chover e eu estava na posse de um bilhete oferecido (em sistema forward) para um jogo qualquer entre duas equipas candidatas a um lugar nas competições europeias do próximo ano. Deixei o IC 19 para trás e, a meio da 2ª Circular, motivado pela água que tinha caído por Lisboa e como consequência da minha resolução de ano novo, rumei apressado ao Alvaláxia. Lá há casas de banho, pensei. Dei por mim a mostrar o bilhete aos seguranças e a entrar na Casa De Banho, como a CNN pensa que os rivais benfiquistas chamam à Casa de Banho ao Estádio de Alvalade.
Felizmente tinha um livro no bolso. Ando sempre com um livro no bolso e outro na porta-luvas do carro porque sei que, de vez em quando, tenho de aturar um congestionamento no IC 19, esperar por uma amiga ou entreter-me no local de trabalho. Comecei a ler as Três Causas da Infelicidade, de Bertrand Russell. A primeira é a competição. Como tem razão este gajo. Como é bonita esta sincronia, pensei. Eu aqui sentado na banheira, preparado para ver duas equipas do meio da tabela a tentar alcançar o Braga e o Boavista, os seus adeptos – coitados! – tão entusiasmados com a ilusão de passarem uns bons momentos, e o velhinho Russell a sublinhar o óbvio: a ambição e a competição, bem como a mania da perseguição (aos outros, que é a 3ª causa de infelicidade), só trazem angústia e são um obstáculo à felicidade dos homens.
De um lado (para dizer a verdade, de todos os lados), estavam os exuberantes adeptos leoninos, todos enfeitados com cachecóis horríveis, de um verde-Sporting, com listas brancas. Muito feio, mesmo. Além do mais, não estava frio que justificasse o pessoal sair de casa naqueles trajes. Mas via-se muita gente que já devia ter idade para ter juízo envolta nos panos de lã, cheios de confiança, falhos de sentido do ridículo. Do outro lado, acantonados, estavam os dragões, a dar vivas a Vítor Baía (verdade se diga que, neste caso, eram apoiados por quase todo o estádio), ao senil do seu Presidente (pois, pois, o Papa é que devia resignar...), e a desejar calamidades a Lisboa.
Pouco antes do jogo começar, o Estádio estava quase cheio de pessoas vestidas com cachecóis verdes e muitas crianças selvagens com bandeiras repletas de símbolos esotéricos. As várias claques de delinquentes sportinguistas entoavam umas para as outras slogans de rico significado e fino humor: «Em cada Tripeiro», ao que a outra respondia «Há um paneleiro». Fiquei chocado. Não só porque conheço vários tripeiros e pelo menos dois deles não são paneleiros, mas também porque me espantou o conhecimento que aqueles selvagens pareciam ter da sexualidade alheia. Só encontro uma explicação para o facto: é que eles sabem por conhecimento... directo, se é que me estão a entender, e aí nada há a apontar. Nestes tempos promíscuos já pouca coisa me devia admirar, embora estranhe que as experiências homossexuais sejam tão comuns.

Depois o jogo. Não esperava muito do Sporting. Uma equipa que tem jogadores como Tinga, Polga, Tello, Pinilla, Hugo, Sá Pinto, Mota, Ricardo, cujo melhor jogador é o Enakarhire (daí a alcunha: Ê nã kerh ire foi o que disse, num português arrevesado, quando o manager o informou que iria para o Sporting) e que tem como treinador o José Peseiro não pode aspirar a muito. Está certo que iria defrontar o F. C. Porto de Leandro, Léo Lima, Cláudio, Bonfim, e outros brasileiros dolentes, e treinado pelo José Mourinhinho Couceiro, mas as camisolas azuis às riscas brancas (bem como as vermelhas) assustam os jogadores lagartos.
O Porto entrou melhor no jogo, mas o Sporting, através da preciosa ajuda de McCarthy, equilibrou a partida. Ou seja, passaram ambos a jogar mal. O Sporting quase que se equipara ao Porto, se o Porto jogar com menos um. Se for com menos dois, então, com o decorrer do tempo e com o inerente desgaste físico do adversário, o Sporting até parece um bocadinho melhor. Daí que o sr. árbitro, que já vinha rubricando uma boa exibição (não chegou a assiná-la), marcando os lances duvidosos sempre a favor da equipa mais fraca, numa manifestação da sua opção preferencial pelos pobres, resolve (já que o Liedson não estava para aí virado) exemplificar o famoso sistema, a que se refere o Presidente do Sporting ou da SAD do Sporting ou lá o que é. Expulsa mais um jogador (um grego qualquer) do Porto, marca pénalti (foi falta) e oferece a vitória ao Benfica Sporting.
A partir daí, o Sporting defendeu bem, aguentou a pressão de jogar apenas com mais dois jogadores que o adversário (não havia maneira de o árbitro expulsar mais um portista), e o mau futebol continuava a assombrar o relvado. Mas quando os adeptos sportinguistas começavam a mostrar sinais de irritação com o mau futebol praticado pelos seus atletas (cá está: a competição causa ilusão e infelicidade), o Sporting marca outro golo. O jogo acabou logo de seguida e toda a gente saiu satisfeita. Não percebo bem porquê. É certo que é sempre agradável ver o Porto perder, mas não me pareceu que fossemos tantos os benfiquistas a assistir ao jogo.
(Ah!, a segunda causa de infelicidade é a inveja).
CC

Divagações XVI

Os quatro elementos fundamentais da vida são a dor, o prazer, o belo e o feio.

AR

segunda-feira, março 21, 2005

mais (um) dia mundial da poesia

«O mundo dos versos é fictício e falso» e «a missa poética tem lugar no vazio mais absoluto».
E mais coisas Contra os Poetas, ditas por Benjamin Péret e Witold Gombrowicz.

Porque tudo isto - o dia mundial, a moda, o discurso, a sem-linguagem, os poetas que escrevem uns para os outros - também é poesia. Uma grandecíssima poesia.




CC

Dia mundial da poesia III

És cruel
Meteste a tua filha num bordel
Enforcaste o teu caniche a um cordel
És cruel

És tarado
Pintaste o sexo cor de rebuçado
No circo tu serias um achado
És tarado

És um porco imundo
Quando queres vais até ao fundo
Não sei onde vais parar

És ignóbil
Não sei qual é que é o teu móbil
És um reciclado de Chernobil
És ignóbil

És vaidoso
Meteste uma pompom na tua franja
Sabes que ainda o dia é uma criança
És vaidoso

És um porco imundo
Quando queres vais até ao fundo
Não sei onde vais parar

És obtuso
Lavas a tua tromba com agua do Luso
O teu nariz é como um parafuso
És tarado

És obsceno
Os teus olhos viciam veneno
Encharcas-te com vinho do Reno
És cruel

És um porco imundo
Quando queres vais até ao fundo
Não sei onde vais parar

És um porco imundo
Quando queres vais até ao fundo
Não sei onde vais parar

Não sei onde vais parar

ENA PÁ 2000

LR

Dia mundial da poesia II

A Queda

E eu que sou o rei de toda esta incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir... Mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência.

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de oiro,
Volve-se logo falso.., ao longe o arremesso...
Eu morro de desdém em frente dum tesoiro,
Morro à mingua, de excesso.

Alteio-me na cor à força de quebranto,
Estendo os braços de alma- e nem um espasmo venço!...
Peneiro-me na sombra - em nada me condenso...
Agonias de luz eu vibro ainda entanto.

Não me pude vencer, mas posso-me esmagar,
- Vencer às vezes é o mesmo que tombar -
E como inda sou luz, num grande retrocesso,
Em raivas ideais ascendo até ao fim:
Olho do alto o gelo, ao gelo me arremesso...

..............................................................................

Tombei...

E fico sé esmagado sobre mim!...

Paris, 8-5-1913
Mário de Sá Carneiro

AR

Dia mundial da poesia

Até parece que precisas de motivos. Até parece que sabes quem determina estas coisas. Até parece que te questionas se o dia mundial é também internacional , e se haverá o dia nacional.Até parece que isso importa.

Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao
precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora- ah, lá fora!- rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes à mostra.


Pastelaria de Mário Cesariny (1923), Nobilíssima Visão.


Sofia

domingo, março 20, 2005

Deus ma deu, Deus ma levou


Million Dollar Baby (2005), de Clint Eastwood
LR

levantem-se e aplaudam


Os rapazes merecem.
LR

quinta-feira, março 17, 2005

O nº 9 do Top Fnac Chiado

«It’s rough times for these bluesy guy-girl garage duos, I tell ya. I mean, sure, if you're the least bit talented you've got a massive hype machine working for you-- which isn't a bad thing-- but you'll never shake those comparisons to the band that built the boat you're sailing. I promise not to mention of the W—S— , maybe as a favor to The Kills, but mostly because the two bands sound nothing alike.
Regardless, the Kills won't need to fish for complimentary comparisons; suckers are jumping out of the water. I'll be damned if vocalist VV (nee Alison Mosshart) doesn't have a picture of PJ Harvey at her bedside, and the same goes double for instrumentalist Hotel (Londoner Jamie Hince) re: Neil Hagerty


Este pedaço de crítica saiu no Pitchforkmedia na altura do Keep on your mean side e basicamente mantem-se tudo na mesma, se possível este No Wow aproxima-se ainda mais do estilo PJ Harvey ( e isso não é mau).
Estamos em território de rock rude, guitarras sujas, lembra terra e areia,deserto e rodeos (tem algo de Texas apesar da banda vir do RU). Se calhar até podíamos evocar a estrada perdida, quiçá o nosso IC 19, que tantas alucinações já provocou nos seus utentes. Afinal aqui também há um “Murdermille” ainda que não contabilizado pelo número de gatos e outros animais mortos.
"At the back of the shell" fica no repeat. Isto de juntar palminhas à música resulta sempre ( que o digam os Outkast, as palminhas mais proveitosas do ano passado). Gosto da forma como os números vão em crescendo no "Dead Road 7" , de first a seven , com particular no third, a dicção que VV dá ao third ...

Farta um pouco mas gosto. Agora as considerações musicais reduziram-se a isto, e no entanto, parecem-me correctas.
Sofia

quarta-feira, março 16, 2005

elementos

Terra. Por direito próprio.
CC

terça-feira, março 15, 2005

Noite de Nevoeiro

O regresso de Santana Lopes à presidência da Câmara Municipal de Lisboa é, ao que parece, como o retorno d'O Desejado. Com a diferença de que praticamente ninguém o deseja.
Clara Ferreira Alves dizia na TSF, na 6ª feira passada, que era uma injustiça considerar-se que o retorno do senhor em causa tinha a ver com motivações pessoais ou, citando-a, "de casa, carro e sustento". Evidentemente, ou CFA não conhece o cavalheiro em causa, ou é tonta, ou lhe está a prestar um servicinho. É evidente que o seu retorno ao município se prende com questões pessoais, ligadas mais ou menos à sua subsistência e à sua sobrevivência política. Pelos vistos, só Santana não percebeu ainda que está morto. E já cheira...
Pelo comunicado emitido ontem à noite, ficamos a saber que ele é desde Sábado passado presidente do município, "por direito próprio". Bom, pelos vistos só ele sabia disso. Carmona Rodrigues disse, no Domingo, na televisão, que não sabia de nada e que se apresentaria ontem nos Paços do Concelho, porque Santana ainda não lhe tinha dito nada. Ninguém, pelo que tenho percebido, sabia de nada. Quanto ao direito próprio, encerra em si mesmo uma contradição insanável (não que isso interesse particularmente ao cavalheiro, mas enfim...).
O direito próprio, ao que se percebe, prende-se com o facto de ter sido eleito para o cargo e pretender, por isso, terminar o mandato. Bom, por essa ordem de razão, e seguindo a mesma linha de raciocínio, então Santana Lopes nunca deveria ter ocupado o lugar de Primeiro-Ministro, porque nunca foi eleito para o lugar. Mas nessa altura, parece que a questão do direito próprio não o incomodou muito.
Para além disso, o seu retorno ao município demonstra a sua completa falta de carácter e de consideração para com os outros. Para começar, é o tratar Carmona Rodrigues como uma espécie de adesivo multiusos que se põe e se tira conforme convém ou se torna necessário (embora aqui Carmona não se saia particularmente bem, ao se sujeitar a estas jogadas). Depois, é o eliminar a possibilidade deste se candidatar, o que seria bem mais positivo para o PSD e para a cidade.
Evidentemente, Santana pode-se sempre recandidatar. Devo confessar que a ideia me agrada. Agrada-me, porque é o passo que falta no caminho da mais total e completa degradação do cavalheiro, deixando uma marca e uma memória que, mesmo num país como Portugal, duvido que volte a ser esquecida. Sinal evidente de que não percebe a realidade em que se insere, incapaz de perceber que o mundo não gira em torno do seu umbigo e que ninguém o quer. Que os lisboetas, tal como o restante país, estão fartos das suas manias, da sua inconstância, da sua falta de respeito pelo compromisso, da sua falta de verticalidade. Agrada-me porque será o capítulo final deste ciclo muito mau que o país viveu nos últimos 6 ou 7 anos. É o bater no fundo que permite, depois, o início de um processo que se espera (e se deseja) regenerador.
AR

segunda-feira, março 14, 2005

O festival

Fica como anúncio, como ideia, como maneira de condensar todos os festivais de Verão elevados a muito melhor. Se fosse esperta mandava o Sudoeste, o Vilar dos Mouros, o Paredes de Coura para as urtigas e ia para Barcelona 26/27/28 de Maio.

Desde 2001 que o Primavera Sound tem vindo a crescer para se transformar no super - festival aqui das Ibérias. Nem sei se o SONAR não se ressente com um cartaz daqueles.

São mais de 50 os grupos distribuídos por 3 dias, com particular ênfase para essa família do género rock alternativo. Há de tudo. Para os velhotes aqui da Coluna, coisas do vosso tempo: Gang of 4, The human League (ainda existem e creio mesmo que estão a bisar este ano), New Order, os habituais Sonic Youth (que até à data não passam por Portugal, pelo menos segundo o site) , They Might be giants, o Iggy Pop & the stooges. Para mim : Tortoise, Mercury Rev, The czars, American Music Club....i més!

Se ao menos metade passasse mais tarde por Portugal....pelo que vejo pelo cartaz do Super Bock Super Rock este ano a viragem é para a combinação metaleiro chunga + Moby (um ódio favorito desde um Meco de 2002, ao vivo é bem execrável...). Ok ainda temos os Broken Social Scene e o Iggy, mas a diferença é abissal. Será um prenúncio para o que virá depois?

Sofia

um excelente fim de semana

O Porto perdeu 4-0 em casa, com o Nacional da Madeira;
o Sporting perdeu por 2-0 com o Penafiel, na casa-de-banho anexa aos cinemas Alvaláxia;
o BENFICA ganhou ao Gil Vicente, com Mantorras, regressado à titularidade, a marcar um dos golos.

Alegria.
Alegria e Liberdade também na Terra.





CC

sexta-feira, março 11, 2005

à Liberdade, que é sempre demasiado pouca


The Great Escape (1963), de John Sturges
LR

Não durma Sr. Eng. ...

Já com uma semana e tal de atraso (um costume aliás, o de não escrever em cima do acontecimento. Todos temos entre nós um White Rabbit que marca as horas e pertinência dos posts, hoje perante o 11 de Março prefiro seguir o Mad Hatter para quem é sempre hora do chá) vou falar sobre curtas. Ou porque é que curtas a concurso deveriam todas, sem excepção, ter um argumento do Mário de Carvalho.
A secção de curtas do Fantasporto é generosa. Demasiado. Tudo entra. Não sei que critérios juntam um videoclip manhoso, uma instalação de 3 minutos, um documentário olhando sobre Esmoriz («É o trabalho final para a cadeira de Multimedia" diz o autor, muito novinho, durante apresentação. Fiquei com dúvidas se a cadeira seria ainda do liceu...depois não a chegaram apresentar), uma curta de animação (que gostei muito) a uma longa que devia ser curta (o "Incognito" com 80 minutos de história que se podia contar em 1/4 do tempo ...). Sentiu-se a falta de bons argumentos. Nas longas metragens também. Proponho um critério mais ou menos objectivo para o ano: argumentos só do Mário de Carvalho.
O realce do escritor está numa das boas surpresas deste ano, foi o autor de "Quem é o Ricardo". O realizador, José Barahona, chegou a receber uma menção honrosa por outra curta, a "Pastoral", que não vimos. A história de Ricardo é simples: um homem, militante do PC, que se depreende que estivesse a viver na clandestinidade, é apanhado pela PIDE. Dele só querem uma informação, quem é o Ricardo. O método seguido a tortura do sono. O respeitinho serviçal sempre presente - «Sr. Eng. não durma...não durma Sr. Eng.!» O cenário uma simples cela pela qual vão passando vários guardas prisionais espelho de personalidades e dramas pessoais (« Sabe, isto não é nada pessoal, mas tenho 4 bocas para alimentar....» ; «Oh Sr. Eng., sabe que eu tenho um cunhado que está com problemas no tractor, como é senhor é da área, pensei que podia ajudar...»). Ainda assim, na hora da porrada e dada a evidente falta de colaboração do prisioneiro, são todos espantosamente eficazes. O homem tem os olhos pisados de sono, cambaleia, delira por vezes, vê a sala andar à roda, mas não cede.
Isto da privação do sono tem muito de terror. Lembro-me que uma vez, estava a estudar para exames e com outros afazeres académicos, passei cerca de dois dias em claro. Após a adrenalina do último exame estava exausta. Meti-me na cama era meio-dia e continuava desperta. A revisão da matéria estudada não parou. Via páginas com gráficos e esquemas. Dei voltas, sentindo o corpo moído e no entanto estava sem sono. Olhei para o tecto e pensei com horror « e se nunca mais dormir?».
Acho que o Sr. Eng. aguentou 7 dias. E sabemos que foi verdade.

Sofia

quinta-feira, março 10, 2005

não há duas sem três

E à terceira é de vez. E foi a conta que Deus fez.
CC

Vão dois

Hoje é dia 10 de Março e só havia ainda um post.
AR

à palmilha dentada

Hoje é quinta-feira, dia 10 de Março, e ainda ninguém tinha postado aqui.
CC

quarta-feira, março 09, 2005

A Canalha

Pedro Santana Lopes vai, pelo que tudo indica, voltar a ocupar o lugar de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Não se discute a legitimidade formal da decisão (embora se deva discutir a razoabilidade da lei que permite estes passeios entre cargos públicos). Do ponto de vista estritamente político, no entanto, a legitimidade do cavalheiro é nula. Nula.
PSL sofreu em Lisboa uma das maiores derrotas do PSD no último acto eleitoral. Na prática, nós que o conhecemos ao longo destes últimos 3 anos e tal e que sabemos a nulidade da sua capacidade de administrar a coisa pública, demos a saber, de forma clara, que não o queríamos mais. Pelos vistos não percebeu.
Mas para além da falta de legitimidade política na reassumpção do cargo, PSL demonstrou, para quem ainda, porventura, o não tinha percebido, a sua completa falta de decência e de respeito pelos outros. No caso, a falta de respeito pela vontade expressa pelos lisboetas nas últimas eleições e a falta de respeito por quem lhe sucedeu.
Carmona Rodrigues estava a fazer um trabalho a todos os títulos notável. Em seis meses, começou a andar a obra do túnel do Marquês (que, apesar dos protestos do costume, é uma obra que trará largos benefícios a quem vive e/ou trabalha em Lisboa), conseguiu desbloquear o problema do Parque Mayer, parece ter resolvido o problema da Feira Popular (possivelmente não voltará a existir, mas está resolvido) e pôs em movimento uma série de pequenas obras, que não dando nas vistas trarão melhor qualidade à vida dos lisboetas. É verdade que tem incomparavelmente menos outdoors do que Santana... E tudo isto sem orçamento – para quem não sabe, o executivo da Câmara não conseguiu ver o orçamento aprovado pela Assembleia Municipal e está a governar por duodécimos, o que significa que pouca mais verba há do que a da despesa corrente para manter o município a funcionar.
Considerando que Santana não se recandidatará a um novo mandato autárquico, o seu retorno para a presidência do Município lisboeta não é mais do que um acto oportunista, para resolver problemas pessoais de cariz financeiro e privado, vivendo à custa do município durante mais uns meses até decidir o que fazer do seu (felizmente praticamente inexistente) futuro político. À sua maneira, queimará qualquer hipótese não apenas de desenvolvimento de um trabalho que se começava a vislumbrar como aniquilará qualquer possibilidade de o próximo candidato do PSD ter um resultado digno (e por resultado digno entenda-se uma derrota acima dos 25%).
Com ele, seguramente, voltarão as atrasadas mentais que viveram durante três anos à custa do orçamento, os ordinários que, sem eira nem beira, se alcandoraram ao 'poder' no município, fazendo tábua rasa de conceitos como honestidade, integridade e dever, os incompetentes (e arrogantes) que desgovernaram Lisboa durante 3 anos, fazendo com que João Soares parecesse um exemplo de competência.
A única coisa que me alegra é que os lisboetas apenas o terão que aturar 7 meses. E 3 deles são os do Verão.
AR

como disse?

Em Junho ou Julho de 1990, já não sei ao certo, estudava eu para o exame oral de Direito Penal. No calor do Verão e com as hormonas aos pulos, tinha que ler frases como esta: «Os elementos do facto que servem de suporte à qualificação do facto como ilícito constituem o facto ilícito, enquanto aqueles elementos que servem de suporte à sua qualificação como culpável constituem a culpa ou culpabilidade (como substrato) ou o facto culpável» - Manuel Cavaleiro de Ferreira, Lições de Direito Penal, volume I, Lisboa, 1988, p. 97.
É claro que, após duas ou três tentativas, deixava o livro aberto nessa página e ia para o Alcântara-Mar. O resultado foi esse mesmo que adivinham.
LR

êxodo

Terra.
CC

terça-feira, março 08, 2005

crónica do Fantas 2005

A Quinta Coluna é o blog colectivo que mais gosta de cinema. Qual Cinerama, qual quê! (desculpa lá, Miguel). É aqui que se ama o cinema. Por essa razão, A Quinta Coluna enviou metade (sim, METADE) da sua tripulação rumo à Invicta (se descontarmos o Beira-Mar, o Boavista e o Braga - só para falar neste ano), para participar de corpos presentes (e vivos) em mais um Fantasporto.
Um dos membros d'AQC estreou-se nas lides (mas voltará no próximo ano, para a 26ª edição, nem que seja à força), o outro (eu) já é veterano no Festival e teve direito a um livro comemorativo dos 25 anos do evento. Bom, tive de pagar 5 €uros, mas isso não vem ao caso.
Vamos então à crónica. No primeiro dia de Fantas, ainda a caminho do Porto, um desvio pela Figueira da Foz, aproveitando o mau tempo (estava um dia lindo, sem nuvens, o que é mau, devido à seca), um almoço em frente ao mar (de lado, mais propriamente), um descanso pós-prandial na areia em frente ao mar (agora sim). Eis senão quando (como eu gosto desta expressão!), um grupo de adolescentes resolve demonstrar publicamente a imbecilidade própria da idade. Mas foi demais. Não há dúvida que os anos de gestão de Santana Lopes à frente da autarquia, a mudança (para pior) das mentalidades, a convivência diária com o pavilhão Santana Lopes, o Mercado Municipal Santana Lopes e a calçada Santana Lopes, deixaram marcas na psique das pobres criaturas que formavam a personalidade no tempo em que o menino-guerreiro (que, recordemos, «berra e sangra» e «precisa de um abraço / da própria candura») orientava os destinos locais. Agora também eles «precisam de um descanso / precisam de um remanso / precisam de um sonho / que os tornem refeitos».
Dias seguintes. Passeio na Ribeira, do lado de Gaia. Erva caseira. Um filme antigo no AMC. Deitar tarde. O Douro. Alheiras. O Benfica elimina o Beira-Mar e segue em frente na Taça. Visita a livrarias. Acordar tarde. Empadas. O Porto quase a perder pontos com o Penafiel. A Foz. O Rivoli – Grande e Pequeno Auditórios. A repetição dos mesmos anúncios, pela mesma ordem, antes da exibição das películas. A apresentação dos filmes, do realizador ou produtor ou actor presentes antes do filme, com cada intervenção a ser fechada com uma salva de palmas pelos espectadores. E (é aqui que reside o espírito do Festival) a maior salva de palmas reservada para a funcionária que recolhe o microfone do palco depois das intervenções das vedetas.
Serralves. Exposições fracas de Robert Grosvenor, de Raoul de Keyser e uma razoável do português João Penalva. Mas o melhor é a meta-instalação psico-surrealista executada pelos funcionários da Fundação. À entrada, com a entrega dos bilhetes, a menina segreda «foi cancelada a greve da Telecom de Timor». «Desculpe?», pergunto eu, confuso. Ela repete «foi cancelada a greve da Telecom de Timor». Está bem, penso. Obrigado. Lá dentro, enquanto apreciávamos seriamente a única obra de arte exposta naquela sala, da autoria do génio americano Robert Grosvenor, e cujo suporte físico consiste num barrote de pinho colocado no chão (mas a arte é sempre mais do que aparenta), o funcionário, já com idade e tarimba para se tornar um crítico de arte, comenta a peça com uma inesperada dança (braços levantados e pernas saltitantes). E depois volta ao "normal", como se nada se tivesse passado. Pouco depois, numa sala maior, preenchida com os quadros exuberantes do belga Raoul de Keyser, a funcionária, com idade para ser minha avó (pronto, vossa avó), começa a cantar uma área de ópera (um excerto, com cerca de 30 segundos). Termina, cita a autoria e a data e volta ao "normal".
Ah! sim, os filmes. O melhor filme do certame, que acabou por vencer a competição, na categoria principal (Grande Prémio), é do Mourinho do Fantas, Vincenzo Natali, que já tinha ganho em 1999, com o excelente Cube, e em 2003, com Cypher. O deste ano chama-se Nothing e isso diz tudo.
CC

porque hoje não é o dia do homem


...

And I a smiling woman.
I am only thirty.
And like the cat I have nine times to die.

This is Number Three.
What a trash
To annihilate each decade.

What a million filaments.
The Peanut-crunching crowd
Shoves in to see

Them unwrap me hand in foot
The big strip tease.
Gentleman , ladies

These are my hands
My knees.
I may be skin and bone,

Nevertheless, I am the same, identical woman.
The first time it happened I was ten.
It was an accident.

The second time I meant
To last it out and not come back at all.
I rocked shut

As a seashell.
They had to call and call
And pick the worms off me like sticky pearls.

Dying
Is an art, like everything else.
I do it exceptionally well.

I do it so it feels like hell.
I do it so it feels real.
I guess you could say I've a call.

It's easy enough to do it in a cell.
It's easy enough to do it and stay put.
It's the theatrical

Comeback in broad day
To the same place, the same face, the same brute
Amused shout:

'A miracle!'
That knocks me out.
There is a charge

For the eyeing my scars, there is a charge
For the hearing of my heart
It really goes.

And there is a charge, a very large charge
For a word or a touch
Or a bit of blood

Or a piece of my hair on my clothes.
So, so, Herr Doktor.
So, Herr Enemy.

I am your opus,
I am your valuable,
The pure gold baby

That melts to a shriek.
I turn and burn.
Do not think I underestimate your great concern.

Ash, ash
You poke and stir.
Flesh, bone, there is nothing there

A cake of soap,
A wedding ring,
A gold filling.

Herr God, Herr Lucifer
Beware
Beware.

Out of the ash
I rise with my red hair
And I eat men like air.

Lady Lazarus - Sylvia Plath

Também porque fui ao Fantasporto e o London Voodoo deixou uma lasting impression.Ou o Firecracker. Todo aquele sangue falso dá para estas coisas violentas.
Sofia

A propósito ...

... do dia internacional da mulher, gostaria de deixar aqui uma nota, em jeito de memória, de outros tempos (?).

[Frases retiradas de revistas femininas da década de 50 e 60]

* Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas.
(Jornal das Moças, 1957)

* Se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e provas de afecto.
(Revista Claudia, 1962)

* A desarrumação numa casa-de-banho desperta no marido a vontade de ir tomar banho fora de casa.
(Jornal das Moças, 1965)

* A mulher deve fazer o marido descansar nas horas vagas. Nada de incomodá-lo com serviços domésticos.
(Jornal das Moças, 1959)

* Se o seu marido fuma, não arranje zanga pelo simples facto de cair cinzas nos tapetes. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa.
(Jornal das Moças, 1957)

* A mulher deve estar ciente que dificilmente um homem pode perdoar a uma mulher que não tenha resistido a experiências pré-núpciais, mostrando que era perfeita e única, exactamente como ele a idealizara.
(Revista Claudia, 1962)

* Mesmo que um homem consiga divertir-se com sua namorada ou noiva, na verdade ele não irá gostar de ver que ela cedeu.
(Revista Querida, 1954)

* O noivado longo é um perigo.
(Revista Querida, 1953)

* É fundamental manter sempre a aparência impecável diante do marido.
(Jornal das Moças, 1957)

E para finalizar, a mais de todas:
* O LUGAR DA MULHER É NO LAR. O TRABALHO FORA DE CASA MASCULINIZA.
(Revista Querida, 1955)

AR

segunda-feira, março 07, 2005

Os putos

Os putos ficaram muito aborrecidos e amuaram. Pegaram no quadro e quiseram mandá-lo às urtigas. Decidiram que era melhor mandá-lo pelo correio e que alguém o haveria de receber. Eu acho que ninguém quer o quadro, mas isso é outra história ... Os putos não perceberam que tirar o quadro não lhes resolve o problema. E o problema é que eles estão num partido que foi criado pelo quadro. Eu acredito que os putos não gostam de se lembrar disso. Mas esqueceram-se que quem mudou foram eles, não foi o quadro. E esqueceram-se que o passado não se apaga. Mesmo atirando os quadros fora.
AR

Olé! (sinal de concordância)

«É por isso que a luta tem de continuar. Não sei se sou "femininista", nem me interessa debater a questão terminológica. Sei que sou contra todas as injustiças e, entre elas, contra a ideologia que nos quer manter encerradas numa Casa de Bonecas. Ao longo dos anos, tenho ouvido de tudo, incluindo mulheres que dizem estar contra a emancipação feminina. Pensei então que não valia a pena perder tempo com tontas. Mais madura, considero hoje que o melhor é retirar-lhes o direito ao voto, o direito ao divórcio e a protecção legal contra a violência doméstica. Se gostam de ser escravas, que o sejam. Acabou-se o tempo das contemporizações. Quem luta, têm direitos; quem se resigna, fica de fora»
Maria Filomena Mónica


Uma amiga (tonta mas amiga) andava sempre de pinça atrás não fosse o namorado apanhá-la com algum pêlo desprevenido. "Deus me livre que ele alguma vez me veja sem ser depilada". O mito da Boneca, apreciado e auto imposto pelas próprias, prospera. Não digo que mais tarde ou mais cedo a inevitabilidade da vida real acabe com estas peneiras, ou que não se tirem dividendos por ser objectos (não obscuros mas bastante evidentes para se mostrar ou outros) de desejo. Mas a trabalheira que isso dá e a futilização do processo são medonhos.

Podes crer. Deus me livre.

Sofia

domingo, março 06, 2005

descubra as diferenças

Muito boa gente (e tanta outra não tão boa) se mandou ao ar com o apoio de Freitas do Amaral ao PS, e agora com a nomeação. O presidente da CIP chamou-lhe "nódoa negra". Normalmente, o argumento mais utilizado é o de ser um "vira-casacas" - talvez esquecendo a inenarrável Zita Seabra.
Muitas vezes discordei do Professor, há uns anos porque estava à minha direita, agora porque provavelmente passou para a minha esquerda. Mas a verdade é que a matriz essencial do seu discurso político (a integração europeia, a democracia cristã, a economia de mercado) se mantém a mesma - bem ao contrário da criatura Seabra, que agora foi ao funeral da Irmã Lúcia como no passado teria ido (se não foi mesmo) aos de Brezhnev, Chernenko ou Andropov. Não terá sido o eixo político que se deslocou para a direita, ou por outras palavras não foi o país que "virou a casaca"?
Acresce que o currículo de Freitas do Amaral é exemplar: em termos académicos (de longe o Professor de Direito com a escrita mais clara e sistemática - um dia deste volto ao assunto para evocar tempos da faculdade), de experiência internacional (foi "só" presidente da Assembleia Geral da ONU), de passado de resistência aos ventos quentes de 1974-75.
Em termos puramente objectivos, e sem morrer de amores (longe disso) pelo Professor, agradou-me a nomeação. Até porque a alternativa seria possivelmente Jaime Gama...
LR

sexta-feira, março 04, 2005

o que é que tinha o Barnabé que era diferente dos outros?

Já foi uma referência na blogosfera. Agora reduziu-se a isto.
LR

quarta-feira, março 02, 2005

e viveram infelizes para sempre


Saraband (2003), de Ingmar Bergman
LR

terça-feira, março 01, 2005

hasta la vitoria, siempre!


LR

Ainda há (boas) surpresas na blogosfera?

Sim. Esta e esta.
LR

This page is powered by Blogger. Isn't yours?