sábado, agosto 30, 2003

Como atingir um orgasmo gustativo

É muito simples: dirijam-se ao Bairro Alto, rumo ao Meson Del Gordo. Encomendem duas ou três tapas, sendo que a última a degustar deverão ser os Lombinhos de Lagosta com Gengibre e Limão. Para acompanhar nem necessitam de grandes extravagâncias vínicas, basta uma imperial ou duas. Quando chegarem aos Lombinhos, meus amigos... posso dizer que o êxtase não tem tradução em palavras. O difícil, isso sim, é conter as lágrimas de alegria. O preço? Quem quer saber...?
LR

Um sonho esquisito que tive há três anos

Sonhei em tempos que estava no Chiado. À frente de um grupo de militares fardados, Artur Semedo gritava para a estátua de Camões: «Ó Luís, acode-nos! Acode-nos, que estão a f.... a Pátria!" Lembrei-me disto hoje porque passei junto à dita cuja estátua. E não é estranhamente apropriado para os dias que vivemos?
LR

Ouvi esta na Antena 2

Um amigo meu trabalhava numa Câmara Municipal mas apanhou o vírus da sisa. Dizem que foi um empreiteiro que lho pegou.
LR

Os amigos

Esses estranhos que nós amamos
e nos amam
olhamos para eles e são sempre
adolescentes, assustados e sós
sem nenhum sentido prático
sem grande noção da ameaça ou da renúncia
que sobre a luz incide
descuidados e intensos no seu exagero
de temporalidade pura

Um dia acordamos tristes da sua tristeza
pois o fortuito significado dos campos
explica por outras palavras
aquilo que tornava os olhos incomparáveis

Mas a impressão maior é a da alegria
de uma maneira que nem se consegue
e por isso ténue, misteriosa:
talvez seja assim todo o amor


José Tolentino Mendonça, De Igual Para Igual

CC

quinta-feira, agosto 28, 2003

Obrigado São Pedro

Os céus choram connosco a derrota de ontem. É bom quando a natureza é solidária - um dia de sol radioso não faria sentido nenhum.
LR

palavras

Quando era criança imaginava que, no purgatório, uma das nossas penas seria sermos obrigados a escrever tudo aquilo que, em vida, tínhamos falado.
Agora estou um bocadinho melhor.

«You start a conversation you can't even finish it.
You're talking a lot, but you're not saying anything.
When I have nothing to say, my lips are sealed.
Say something once, why say it again?
»

Talking Heads, Psycho Killer
CC

mais Benfica

Eu podia aqui escrever o que me vai na alma sobre o Benfica de hoje, mas o LFB já disse tudo o que há para dizer.
CC

true love waits

É incondicional: Amo-te, Benfica.
CC

quarta-feira, agosto 27, 2003

BENFICA

BENFICA! BENFICA! BENFICA!
BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA!
BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA! BENFICA!

CC

Eli, Eli, lama asabthani?

Partilho o desconsolo da Patrícia do PVG. Resta-me, como a JPP, a pragmática kantiana?
Terei forças para olhar de frente a morte como se ela não existisse, agora que nem me atrevo a pronunciar o que outrora vivi?
CC

terça-feira, agosto 26, 2003

Soneto de Carnaval

Distante o meu amor, se me afigura
O amor como um patético tormento
Pensar nele é morrer de desventura
Não pensar é matar meu pensamento.

Seu mais doce desejo se amargura
Todo o instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado uma tortura
Um ciúme do próprio ciumento.

E vivemos partindo, ela de mim
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos
Para a grande partida que há no fim

De toda a vida e todo o amor humanos:
Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo
Que se um fica o outro parte a redimi-lo.

Vinício de Moraes, 1939
in Livro de Sonetos, ed. Companhia das Letras

AR

Estou estarrecido...

http://www.muitomentiroso.blogspot.com/

Think for a Minute!

Something's going on, a change is taking place
Children smiling in the street have gone without a trace
This street used to be full, it used to make me smile
And now it seems that everyone is walking single file
And many hand their heads in shame
That used to hold them high
And those that used to say hello
Simply pass you by

Think for a minute, Stop for a minute
Think for a minute, Stop for a minute

I always said it could, they never though it would
The people look so pitiful, I'm thinking that it should
And now it's almost here, now its on its way
I can't help saying told you so and have a nice final day

And nothing I could say
Could ever make them see the light
Now apathy is happy that
It won without a fight

Think for a minute, Stop for a minute
Think for a minute, Stop for a minute

And many hang their heads in shame that used to hold them high
{Think for a minute}
And those that used to say hello simply pass you by
{Stop for a minute}

Think for a minute, Stop for a minute
Think for a minute, Stop for a minute

The Housemartins, London 0, Hull 4 (1986)
CC

classe

Não resisto a contar-vos um episódio que se passou, há pouco tempo, na Região Ditatorial da Madeira:
No Hotel Savoy, um cinco estrelas instalado naquele bela região governada por energúmenos, um cliente, agastado com o terrível facto de os lençóis da sua cama terem sido engomados dobrados (e não abertos, como toda a gente faz) e, assim, apresentarem vincos(!), reclamou e recusou-se a pagar a conta.
Foi aceite a reclamação e o cliente nada pagou.
Desconhece-se, no entanto, se o cliente terá apresentado um pedido de indemnização, mas parece que não. Ainda há consumidores muito tolerantes.
CC

segunda-feira, agosto 25, 2003

A propósito do Avô

PVG, a propósito do Avô, tece algumas considerações interessantes acerca de uma evolução do sistema democrático. Propõe, a propósito, a criação de colégios eleitorais, voto censitário e algumas alternativas mais ou menos na mesma linha. E por isso, motivou-me a escrever algumas linhas sobre Democracia.
As ideias de PVG não são, como será do conhecimento geral, novas. Pelo contrário, foram praticadas há já algum tempo (em alguns casos) ou ainda existem (noutros casos), com consequências que não me parecem as melhores (como a eleição do Presidente George W. Bush, com menos votos do que o seu adversário). Devo dizer que não partilho deste entusiasmo de PVG, embora voltar atrás nem sempre seja, necessariamente, mau.
Mas de qualquer das formas elas levantam uma questão fundamental: a preparação para a vivência em democracia. Na realidade, a Democracia caracteriza-se, grosso modo, pela existência de um conjunto de direitos e deveres. Aos deveres não darei aqui particular importância, porque a esses se encarrega o Estado (ou dever-se-ia encarregar) de dar a conhecer e fazer respeitar. Mas aos direitos, já a mesma atenção não é dada. Um pequeno exemplo: quando preenchemos a nossa declaração de IRS, as receitas são copiosamente analisadas, mas já quanto aos abatimentos que podemos fazer não vemos o mesmo entusiasmo por parte das autoridades fiscais.
Daqui resulta que os direitos existem mas é imprescindível saber que eles existem e como os utilizar. Para isso, é necessário reunir um conjunto de requisitos mínimos, que vão desde a instrução à cultura. Para quem não está preparado, seja porque motivo for, não é relevante se os direitos existem ou não, porque de facto nunca existem. A incapacidade de utilização de um direito corresponde necessariamente à não existência dele.
Em Portugal, como aliás na grande maioria dos países democráticos, o desinvestimento na educação e na cultura implica, obrigatoriamente, a menor capacidade cívica dos cidadãos e, consequentemente, a menor capacidade para se fazerem valer dos seus direitos. E assim, temos Democracias tendencialmente menos democráticas, aproximando-se da figura da Oligarquia, porque cada vez mais um número reduzido de indivíduos têm acesso a uma educação de qualidade e, consequentemente, ao pleno exercício dos seus direitos.
Não sei se se deixou de gostar da ideia do poder ao Povo, visto aqui como o conjunto dos cidadãos e não com a carga política e ideológica que normalmente esta palavra tem entre nós. Eu continuo a achar que sendo um sistema necessariamente imperfeito, porque humano, é o menos mau de todos (não será, mesmo, razoavelmente bom?). Mas acho que avançamos rapidamente para sistemas democráticos meramente formais, onde o indivíduo é, cada vez mais, um consumidor de reality shows, comida 'fast' e má, e pouco poder reivindicativo.
AR

Olá e os sete

Aqui está um caso para o Tiago: a Olá lançou uma linha de 7 gelados horrorosos, a que deu o nome de «7 pecados mortais».
A inovação é que um dos clássicos sete pecados morais, a Ira, foi eliminado e substituído por outro - a «Vingança». Ficamos a saber que, para estes cretinos, a vingança é um pecado mortal.
Mas não é. Por enquanto, a Doutrina não é uma questão de "opinião".
O pecado é uma falta contra a razão, a verdade, a consciência recta. E a raiz do pecado está no coração do homem, na sua livre vontade.
O pecado mortal destrói a caridade no coração do homem por uma infracção grave da lei de Deus; afasta o homem de Deus, que é o seu fim último e a sua bem-aventurança, em detrimento de um bem inferior.
Para que um pecado seja mortal tem de preencher três requisitos: ter como objecto uma matéria grave (concretizada nos Dez Mandamentos e também em Mc. 10:19), cometido com plena consciência e com deliberada vontade (dolo).
A vingança é uma acção condenável, eventualmente despoletada por um pecado mortal (a ira, por exemplo). Mas não é um pecado mortal em si mesmo.

Já agora fiquem a saber que as quatro virtudes cardeais são a Prudência, a Justiça, a Fortaleza e a Temperança. E que as virtudes teologais são três: a Fé, a Esperança e a Caridade.
Agora pergunto à Olá: para quando gelados de inspiração recta?
CC

Não vejo

Não vejo as flores que me não mandas,
Não vejo os braços que me não chegam,
Não vejo teu corpo, nem se me amas
Sei. Apenas as distâncias se não fecham.

Não vejo teus olhos, que me não brilham,
Não vejo tua boca, que me não ri,
Não vejo as flores, que me não chegam,
Sei apenas a distância que não vi.

Olho só, perdido, a distância
Deste imenso mar que me separa
De teu corpo, tua doce fragância.

Vejo apenas, triste, esta amarra
Que na sua imensa arrogância
Me não deixa ainda partir nem amar.
AR

sábado, agosto 23, 2003

PROFISSÃO DE FÉ

A Quinta Coluna é um blog colectivo.
É um blog - a roçar a genialidade - da autoria de três amigos, com diferentes opiniões, interesses variados, posições políticas opostas e divergentes visões sobre o mundo, a sociedade e o indivíduo.
Em comum, têm os autores poucos factores: serem heterossexuais (até ver); a sorte de partilharem a superioridade moral dos benfiquistas (até sempre); e uma amizade que os une há quase vinte anos.
Quanto ao resto, torna-se improvável um entendimento comum face a qualquer assunto. Daí que A Quinta Coluna não tenha uma linha editorial própria.
Após a degustação de uns simpáticos queijos e enchidos, acompanhados de um tinto competente e de um pão substancial, estabeleceram os autores a adopção de regras de utilização deste invejável espaço de liberdade. No entanto, tais normas não são do interesse público, pelo que apenas serão reveladas a título póstumo, pelos exegetas da blogosfera e pelos biógrafos dos seus autores.
Para já, fica expressa a inveja d'A Quinta Coluna por todos aqueles que dela podem usufruir sem sofrerem a angústia da criação, o peso do dever moral e a responsabilidade da influência pública.
AR, CC e LR.

sexta-feira, agosto 22, 2003

piu piu

piu.
CC

feira franca

Afinal, não são apenas os Blasted Mechanism a irem a Avis.
Segundo o desabafos, também a Dana Scully estará presente.
Eu também vou. :)
CC

Quosque tandem, LR, abuteris patientia Delgadi?

As intervenções do meu amigo LR são-me particularmente gratas porque dão um certo ar 'profissional' a este blog. Fazendo dele um blog nada inferior a outros que por aí andam. Acho aliás o meu amigo LR uma pessoa excessivamente culta que se perde em alguns dos comentários. Eu explico.
A propósito da história do "Miguel Strogoff" e do "Tio Patinhas" devo dizer duas coisas. Primeiro, a referência ao "Tio Patinhas" impediu, pelo menos, uma qualquer confusão culinária com o titulo da obra. Segundo, a comparação entre o Miguel e o Tio torna inútil o título latino do 'post', porque provavelmente LD não o saberá traduzir nem saberá de onde vem.
AR
P.S.: Agora mais a sério, têm pensado naquela história dos autocarros? Saberá LD alguma coisa sobre isso? Receberá comissão? E se recebe, estenderá a sua influência comercial ao Iraque? Quantos autocarros disponíveis para rebentar existirão no Iraque? Ou lá é só camiões de cimento? E as empresas que fabricam camiões de cimento tambem pagarão comissões? Tantas dúvidas e nenhuma resposta...

mais Maggiolo

Também recebemos este mail:
«As palavras de Mari Alkatiri, das recentemente proferidas sobre Magiollo Gouveia, são as que mais se aproximam da verdade dos factos.
Não me esqueço do que ouvi a uma professora do liceu de Díli, evacuada por ocasião do golpe da UDT, interrogando-se anos mais tarde sobre a opção que então tomou de não permanecer em Timor: "Ficar para quê? Mataram à queima-roupa todos os meus alunos...".
Esclareça-se: jovens adolescentes militantes da Fretilin, desarmados, não combatentes, assassinados pelos golpistas armados pelo Tenente-Coronel e Comandante da PSP de Díli, Maggiolo Gouveia.
A história do seu sequestro pela UDT obviamente que não passou (e não passa!) de uma mentira conveniente.
Há mais mortos que também têm que ser respeitados...
LTN»
CC

mais «desgosto artificial»

A propósito do nosso post «desgosto artificial», de 20 de Agosto, recebemos, por e-mail, este comentário, que publicamos, já devidamente autorizado pela autora, bolseira portuguesa na Universidade da Virgínia (EUA):
«Agora um comentário ao post «desgosto artificial». Pois. Tem muita razão, o CC. É que aqui já se atingiu a tua premonição da perda dos sentidos gustativos por parte da população em geral.
Há uma imensidão de adultos que se alimentam como crianças de 5 anos, se as deixamos comer o que quiserem e quando quiserem. É muito triste. E, claro está, há o pormenor de o metabolismo de um adulto ser bastante distinto de o de uma criança.... O que os meninos assimilam para crescer, os graúdos acumulam em forma de gorduras, localizadas particularmente no abdómen. Há também o pormenor de que os tais sabores primários são os mais reconfortantes a nível mental.
Claro que, nesta sociedade individualista e solitária, as pessoas procuram conforto mais facilmente na comida do que nos amigos ou familiares. E então lá vai de "binge" (eu não sei dizer isto em português) em bebidas açucaradas, batatas fritas, hambúrgueres, chocolatinhos e o que mais.
Mas... agora eu discordo do CC. Eu não acho que quem deva ser julgado sejam as cadeias de fast-food. Os indivíduos tem de ser considerados e tratados como adultos, responsáveis pelos seus actos e escolhas. Esta é uma sociedade na qual cada vez mais há uma desresponsabilização dos indivíduos. Caminha-se para um mundo onde tudo é escolhido para nós e não por nós. As pessoas não querem ter de pensar, tomar decisões e assumir os seus erros. Isso é um caminho muitíssimo errado.
Mas há um pormenor. Aqui neste país, é quase como se pudessemos distinguir os menos abastados pelo volume corporal. Eu explico. Ao contrário do que (ainda) é o caso em Portugal, aqui os alimentos baratos são os hambúrgueres, os congelados, os enlatados, as bebidas gasosas. Uma alimentação saudável, incluindo vegetais e fruta fresca, carne e peixe frescos, pão (pão mesmo, não aquela substância branca, doce e esponjosa que se vende em sacos de plástico, às fatias), água (!?) etc., é um luxo ao qual nem todos se podem dar. E daí que seja quase um carimbo que se põe nos pobres - eles distinguem-se porque são gordos.
Foi a isto que se chegou, no primeiro mundo os pobres não morrem à fome, morrem de obesidade. Então quem deveria ser julgado, não será talvez este governo? Não são eles os responsáveis pelos preços astronómicos dos alimentos não-processados? Uma alimentação saudável não é um bem de primeira necessidade?
AR»
CC

Quosque tandem, Delgadus, abuteris patientia nostra?

Há uns dias atrás, o meu ilustre colega bloguista CC mencionava o nome de Luís Delgado, a propósito de "blogs" e "opinion makers". A criatura em causa é um dos melhores argumentos para não ler o DN, em particular quando já não temos Vasco Pulido Valente para contrabalançar (lembram-se do que VPV escreveu sobre o pós-Guerra do Iraque? Infelizmente profético, como é habitual...).
No caso do "Expresso", que por inércia continuo a comprar, consegui desenvolver apuradas técnicas para não ler uma única linha que seja escrita por Rui Henriques Coimbra. Talvez tenha de a aplicar ao DN e a Delgado.
Em todo o caso, não resisto a recordar um episódio sintomático. Em debate realizado (creio que na SIC) aquando da Guerra do Iraque, o qual versava sobre o papel dos jornalistas na frente de combate, Nuno Rogeiro referiu que a realidade nesse campo evolui bastante desde o inesquecível "Miguel Strogoff". Para quem não saiba, Júlio Verne (esse gigante!) criou no romance em causa duas personagens, um repórter francês e outro britânico, que acompanhavam a frente de combate na Rússia czarista, e que se degladiavam para fazer chegar às respectivas redacções as últimas novidades. Memorável aliás a passagem em que o francês chega primeiro ao telégrafo, consegue transmitir a sua crónica, e para sabotar o trabalho do inglês - que aguardava de seguida - começa a ditar ao telegrafista a Bíblia...
Mas voltando ao Portugal de hoje, quando Rogeiro falou no "Miguel Strogoff", Delgado retorquiu: "E a seguir, vais falar no Tio Patinhas?". Sem comentários...
LR
zardoz@sapo.pt

Ainda Maggiolo

Uma qualidade ancestral dos portugueses era a "modéstia". Não no sentido de desmerecer as próprias qualidade, mas no de saber estar em cada local e em cada ocasião. Mais como sinónimo de respeito, por conseguinte.
Quando alguém é sepultado (e por isso se diz "funeral" e não "enterro", Senhor Ministro) manda a sábia "modéstia" que se respeite o defunto e os seus familiares. Considero pois tão infelizes quer a inoportuna declaração da senhora em causa, quer a insuportável "pose de Estado" do Senhor Ministro, que nem ao próprio deve convencer. Se calhar deviam ter começado por aí...
Quanto à questão das "honras militares", uma vez mais se esqueceu o essencial. Das duas uma, ou o Código de Justiça Militar (ou outra lei aplicável ao caso, confesso a minha ignorância mas também não houve quem o explicasse) prevê expressamente a (in)aplicabilidade das mesmas em função do caso concreto, e nesse caso poderíamos aferir da (i)legalidade do acto do Senhor Ministro; ou a lei é omissa, e sendo o acto discricionário seria então sindicável do ponto de vista político. O resto é a desinformação do costume.
LR
zardoz@sapo.pt

quinta-feira, agosto 21, 2003

Porque não há nada para perguntar ...

Eu devo dizer que concordo inteiramente com a lei aprovada no Knesset, que distingue os cidadãos israelitas judeus dos outros. Principalmente dos palestinianos. Essa cambada.
Vejamos. Os palestinianos são uma cambada. Ponto. Andam sempre a rebentar por aqui e por ali. Não se consegue ter uma rua limpa que logo aparece um palestiniano a rebentar: rebenta com ele, rebenta com os outros, rebenta com a rua ... é um aborrecimento. Tudo sujo, bocados de tudo por todo o lado.
Para além disso há o prejuízo que eles dão só em autocarros. Já alguém terá feito as contas aos autocarros que eles têm mandado pelo ar? É claro que lucram as empresas que fabricam autocarros ... hummm ... por acaso nunca tinha pensado nisso ... hummm ... se calhar era melhor investigar se as fábricas de autocarros não têm acordos com os palestinianos para eles se fazerem rebentar nos autocarros ... !
Adiante.
Para além disso, os palestinianos não são, na sua maioria, judeus. Aliás, deverão haver poucos palestinianos judeus. Ora se eles não são judeus então não precisam da cidadania israelita, não é? Isto é assim, pão, pão, queijo, queijo. Se não querem ser judeus também não levam com a cidadania. Para mais, devia ser proibido os palestinianos casarem com os judeus. Porque com a mistura dos genes um dia destes estão os israelitas filhos de palestinianos a rebentar por aí, em qualquer esquina ou dentro de qualquer autocarro, a sujar tudo.
Para além disso estas coisas também não são bem assim, porque afinal Israel é uma democracia e portanto não faz leis segregacionistas. Esta lei é apenas clarificadora. Sim. Clarificadora. Assim fica mais claro quem pode ter nacionalidade israelita e quem não pode. Ora a clarificação, como se sabe, é uma coisa boa, principalmente quando é feita desta maneira: às claras. Sim, porque a lei não é secreta, portanto foi tudo feito às claras.
Deve-se ainda referir que cada povo tem direito à sua vingançazinha. Assim, o Estado de Israel está apenas a fazer clarificações semelhantes às feitas há 70 anos na Alemanha. Ora se uns puderam porque é que os outros não poderão poder? Afinal, não são menos do que os alemães e isto ou há democracia ou comem todos.
E veja-se só, os israelitas são assim mesmo uns para os outros. Afinal, os judeus africanos são menos do que os outros, não são? E os que têm tranças amaricadas e andam sempre vestidos de preto também são mais do que os que não têm tranças amaricadas e não andam vestidos de preto, mas têm apenas uma gazezinha no alto da cabeça, não é? E os que dão umas cabeçadas lá num muro também valem mais do que os que não dão, não é?
E, afinal, o que é que isso nos interessa? Eles até são nossos amigos, não são?
AR
P.S.: Mas acho que devemos mesmo investigar aquela coisa dos autocarros ... Quem venderá aqueles autocarros?

por que razão o abrupto não pergunta porquê?

O Knesset, o parlamento israelita, aprovou, no passado dia 2 de Agosto, com 53 votos a favor, 25 contra e 1 abstenção, uma lei que nega a cidadania israelita a palestinianos que tenham casado com israelitas.
Ver detalhes aqui.
CC

promoções

Fui à fnac do Colombo. Aos saldos (aliás, "promoções") de livros:
Vejam só o que trouxe:
- «Angela’s Ashes», de Frank McCourt (assim, em inglês, para eu treinar esta língua bárbara), numa atraente edição da Harper Collins Publishers, com um pequeno defeito na capa (agora imperceptível depois de um arranjinho com fita-cola), por 1,50 €;
- «Síndroma de Abandono» (1º capítulo), um clássico da psicanálise, de 1950, de Germaine Guex, Edições Sá da Costa / Público, também por 1,50 € - para não me esquecer de quanto somos frágeis e carentes de amor e de como são estruturais os medos, as frustações, a solidão, a ...;
- e a cereja em cima do bolo, «A Conversa de Bolzano», de Sándor Márai, da Teorema, por 2,50 €.
Sándor Márai é um escritor húngaro (1900-1989), um clássico dotado de uma escrita límpida, polida, muito envolvente, cujas palavras depuram e traduzem o mais complexo da alma humana. Por coincidência, li há pouco tempo o fabuloso «As Velas Ardem Até Ao Fim », editado pela D. Quixote. «As Velas...» é um livro sobre o mais puro e belo dos sentimentos: a amizade masculina.
Boa leitura para este tempo de ruínas:
«- Que queres desse homem? - perguntou a ama.
- A verdade - disse o general.
- Conheces bem a verdade.
- Não conheço (...). É mesmo a verdade que não conheço.
- Mas conheces a realidade - disse a ama numa voz aguda, ofensiva.
- A realidade não é a verdade - retorquiu o general - A realidade é apenas um pormenor.
»
(...)
«Uma pessoa sempre responde com a sua vida inteira às perguntas mais importantes. Não importa o que diz entretanto, com que palavras e argumentos se defende. No fim, no fim de tudo, com os factos da sua vida responde às perguntas que o mundo lhe dirigiu com tanta insistência. Essas perguntas são as seguintes: Quem és tu?... Que querias realmente?... Que sabias realmente?... A que foste fiel ou infiel?... A quê ou a quem mostraste ser corajoso ou cobarde? São essas as perguntas. E uma pessoa responde como pode, duma maneira sincera ou mentindo; mas isso não tem grande importância. O importante é que, no fim, uma pessoa responde com toda a sua vida».
CC

quarta-feira, agosto 20, 2003

desgosto artificial

A propósito do post «gosto artificial», do canhoto J, acresce dizer que a estratégia de artificializar o gosto se estende a áreas perigosas, que se prendem com a natureza humana.
É sabido que as multicionais da alimentação rápida (McDonald's, Burguer King, Pizza Hut e companhia) apuraram o gosto dos seus produtos no sentido de os reduzir aos sabores mais primários que o ser humano reconhece. Daí que as crianças (que ainda não desenvolveram toda a complexidade de reconhecimento gustativo que contém a diversidade das papilas gustativas) se entusiasmem tanto com os sabores dos hamburgueres e molhos e sobremesas dessas casas.
A consequência mais grave da proliferação monopolizante destas seitas prende-se com a perda da diversidade gustativa dos indivíduos. É como se reduzissemos o espectro das cores às cores primárias.
Se, por exemplo, levamos tantos anos a aprender a apreciar um bom vinho (como uma música menos imediata ou um livro mais complexo), tal deve-se à riqueza que esse produto contém em si, e que exige educação dos sentidos. Pelo contrário, um hamburguer do McDonald's - como o aroma do couro artificial, os aromatizantes para flores, pão, bolos, frutas, etc. - é perceptível de imediato como "agradável", devido ao adocicado e salgado dos molhos.
As gerações novas, mais expostas a estes gostos únicos, e com menos oferta (ou de mais difícil acesso) à diversidade natural dos alimentos, própria da alimentação tradicional, verão empobrecido o desenvolvimento das suas próprias papilas gustativas.
Ora, não acham que estas empresas deviam ser julgadas por atentados à natureza humana?
CC

2 + 2 = 5

Esta canção podia ser dedicada a Sérgio Vieira de Mello e ao trabalho de Sísifo da ONU.
Recorde-se que «hail to the thief» foi a saudação de muitos americanos ao presidente George W. Bush, depois do modo atribulado como este ganhou as eleições.

«are you such a dreamer?
to put the world to rights?
i'll stay home forever
where 2 and 2 always makes up 5

i'll lay down the tracks
sandbag & hide
January has April's showers
and 2 and 2 always makes up 5

it´s the devil´s way now
there is no way out
you can scream & you
can shout
it´s too late now
because
YOU HAVE NOT BEEN
PAYING ATTENTION
paying attention
paying attention
paying attention

i try to sing along
i get it all wrong
cos i’m not
cos i’m not
i swat 'em like flies but like flies
the buggers keep coming back
cos i'm not
maybe not
"all hail to the thief"
"but i'm not!"
"don't question my authority or put me in the dock"
cos i'm not!
go & tell the king that the
sky is falling in
when it's not
maybe not
maybe not
»

(Radiohead, do álbum Hail To The Thief)
CC

terça-feira, agosto 19, 2003

morreu Sérgio Vieira de Mello

Soube agora pela TSF.
Não me ocorre dizer mais nada. Isto é só uma pequena homenagem.
CC

Não tão arrependidos

Li com cuidado, e não escondo que com algum bom humor (isto do cinismo é uma coisa maravilhosa!), as palavras do meu amigo CC e do Sr. Mari Alkatiri.
As palavras do meu amigo CC eram esperadas, pois temos ideias sobre a questão muito diferentes que debatemos vai para 17 anos, sempre com o mesmo empenho e com o mesmo entusiasmo e, devo dizer, com consequências razoavelmente inúteis, já que cada um se mantém, confortavelmente, na sua posição original.
Já as palavras do Sr. Mari Alkatiri me parecem verdadeiramente extraordinárias. Se não, vejamos.
Primeiro, o Sr. Alkatiri afirma, peremptoriamente, que tinha sido o Tenente-Coronel Maggiolo Gouveia que iniciou o conflito. Confesso que fiquei, a princípio, sem palavras. Já tenho ouvido idiotices grandes, mentirolas crassas, fanfarronices despudoradas mas isto, meus senhores, ultrapassou tudo o que até hoje li e ouvi. Eu estava convencido, por aquilo que estudei sobre o conflito de Timor (porque o fiz, por obrigações académicas) que a FRETILIN tinha sido a grande responsável, com o auxílio de oficiais portugueses no terreno, que mais não eram do que comissários políticos dos tais partidelhos amplamento referidos nas intervenções anteriores. Com a sua inclinação para a esquerda maoista (aliás tinha o apoio mais ou menos velado da China comunista), com o seu plano de socialização e com a proclamação da independência.
Foi isto que começou a guerra. Não foi a acção do Tenente-Coronel Maggiolo Gouveia. Só fico mais descansado por o Sr. Alkatiri «discordar da forma como foi morto» o militar português. Fica-me apenas uma dúvida: acha que talvez fosse melhor se tivesse sido morto de outra forma?
AR

arrependidos

Não concordo em nada com o que o meu camarada AR escreveu aqui sobre as honras fúnebres a quem desobedeceu ao seu país, desertou do exército que era suposto servir e que - indirectamente, é certo - contribuiu para o conflito que se seguiu e que degenerou na guerra civil que todos conhecemos. Aliás, não sou só eu (ou a "esquerda") a pensar assim. Ouçamos as palavras de Mari Alkatiri, primeiro-ministro timorense, para termos uma ideia mais ampla sobre o assunto.
É claro que esta questão divide os portugueses. É óbvio que esta iniciativa visa criar uma cortina de fumo - só quem não conhece o senhor Ministro de Estado e da Defesa pode duvidar disto.
Mas escrevo este post para lembrar a AR e aos leitores que, na mesma data, o nosso Primeiro-Ministro também militava activamente no mesmo "partidelho que defendia e apoiava os responsáveis pelo fuzilamento". E então? Ao oportunismo e incoerência chama-se "evolução" e "adaptação", não é?
CC

A galinha da capoeira

Cheguei a casa já tarde. Não tinha acompanhado as notícias ao longo do dia e, por isso, liguei a televisão na SIC Notícias e sentei-me a ver o que de mais importante se tinha passado.
Depois de uma ou duas notícias fui surpreendido por uma qualquer agitação a que não dei muito apreço no início acerca de umas honras militares. Prestei atenção. Uma senhora com um ar visivelmente alterado gritava estridentemente no pequeno ecrã. Era já uma gravação de uma intervenção anterior. Prestei mais atenção.
A senhora não queria que o Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional estivesse presente no funeral de um antigo militar português que cumprira serviço em Timor e que se juntara à UDT, sendo detido pela FRETILIN, torturado e, finalmente, executado por um pelotão de fusilamento daquela organização. Entendia a senhora que essa atitude do Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional estava a reabrir feridas antigas que dividiriam a sociedade portuguesa.
Convidada a debater esta questão com o porta-voz do CSD/PP, a senhora declinou o convite.
Ora, algumas considerações entendi dever tecer.
Sinceramente, não me interessa nada se o Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional estava presente no funeral ou não. Acho que existem coisas mais importantes, mesmo no campo da defesa, como a falta de meios para os militares desempenharem cabalmente a sua missão ou a falta de direcção política na defesa, por manifesta incapacidade do Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional.
Mas gostaria de dizer que esta atitude do Senhor Ministro de Estado e da Defesa Nacional em nada divide os portugueses. Prestou honras a um oficial morto numa situação perigosa num difícil momento histórico em nome de um ideário que não pretendo aqui julgar. O que divide os portugueses são as alimárias que, esquecendo o seu passado truculento e numa atitude bacoca, vêm hoje levantar, aí sim, fantasmas que deveriam estar enterrados há muito. É que, se me não falha a memória, na altura em que o referido oficial era fusilado pela FRETILIN, a dita senhora militava activamente num partidelho que defendia e apoiava os responsáveis pelo fuzilamento.
AR

Em defesa da Terra plana

Tenho para mim que a Terra deveria ser plana. Nós íamos andando e, a certa altura, acabava-se. Assim, tal e qual. Normalmente deveria acabar no mar. Haveria um pouco de mar e depois uma imensa catarata tombaria e desapareceria no imenso negro do Universo. Acho esta ideia muito mais romântica e apelativa.
Imagino toda a sorte de criaturas mitológicas suspensas num limbo para além da terra e do mar, não necessariamente ameaçadoras mas, ainda que o fossem, seguramente belas.
As estrelas seriam aí mais brilhantes, mais próximas de nós, e as constelações dançariam ao compasso da música feita pela água a caír no infinito.
Ao mesmo tempo acho que a Terra seria mais temporal. O eterno retorno que o círculo permite é, simultaneamente, intemporal porque sempre se está. Nunca se chega verdadeiramente a partir porque fatalmente sempre se volta ao princípio, ao ponto de partida.
Julgo que esta noção de intemporalidade é perfeitamente nociva. O permanente voltar a estar significa a permanente não assunção das responsabilidades porque tudo volta a ser. Tudo é infinitamente redimível.
Muitas vezes me perguntam se não gostava de poder viver para sempre. Respondo sempre que não. A náusea da eternidade é francamente mais forte do que o desejo da própria eternidade. O vício do infinito é, simultaneamente, o vazio do infinito.
Prefiro, definitivamente, a Terra plana.
AR

segunda-feira, agosto 18, 2003

a TSF

Concordo com o canhoto J: pouco se pode fazer para salvar a TSF, tal como ela é - uma emissora noticiosa interventiva, de elevado nível informativo e cultural - e evitar que esta se transforme em mais uma frequência pobre de conteúdo, ao sabor das audiências (e a puxar para baixo o nível de exigência, à semelhança do que se passa com as televisões) e a emitir a voz do dono.
Podemos é deixar de ouvir a nova TSF.
Honra seja feita ao Pacheco Pereira que, sem o Carlos Andrade, deixa de participar no Flashback.
Eu já nem compro o DN.
CC

a mim ninguém paga

Luís Delgado escreveu o que Pedro Rolo Duarte e outros não tiveram coragem de dizer: que os blogs têm "um inconveniente para os comentadores «oficiais» e pagos: é que se passam a usar os blogs, deixam de ter interesse e valor. A que título é que os jornais, televisões ou rádios investem em líderes de opinião que opinam gratuitamente? É por isso que os blogs são um extraordinário sucesso popular desde 2001, noutros países, e em Portugal, mas nunca para «opinion makers"».
Pois é. Pelo menos este rapaz admite que o seu trabalho só é pago porque interessa ao patrão publicar o que ele escreve - ou seja, que ele faça opinião. Não porque seja particularmente brilhante ou original na análise politica, social, económica ou cultural do país (grande parte dos blogs faz isso muito melhor), mas porque o seu patrão quer que seja publicada a opinião dele. Até «investe» nisso. Por que será?
CC

Maledicência

A revista "Record Collector" do presente mês de Agosto anuncia para breve um leilão do recheio da casa londrina de Sir Elton John. O único item em destaque, com direito a fotografia, é um busto de Napoleão. Não havia necessidade...
LR
zardoz@sapo.pt

boa notícia

O Paulo Varela Gomes tem um blog.
Seja bem-vindo. Fazem falta vozes inteligentes (e cabeças arejadas) de esquerda.
CC

domingo, agosto 17, 2003

Os mitos

Ah ... o mito. Há quanto tempo o não via e que saudades, Deus meu. Fui ver. Lá fora o mito caía, branco e leve, branco e frio.
É assim a vida. Quase todos os mitos têm pés de barro. Só esta conclusão é válida pois é a única à qual se pode chegar. Reparai bem ...
O Blog era mítico. Já não é. O blog caiu no meio do povo. Tornou-se vilão, grosseiro. Agora está ao alcance do vizinho suado que nos acompanha no metro. Está na mistura entre odor corporal e desodorizante rasca, comprado na mercearia da esquina, do Zé que já não tem o lápis atrás da orelha mas antes usa o pequeno 'organiser' electrónico para fazer as suas encomendas. O Blog é agora do Diogo, que estuda na Universidade mas que não sabe escrever e dá erros quando tenta. Da Zinha, diminutivo de qualquer coisa, não interessa porque cai sempre bem, que todos os meses muda a cor das lentes de contacto porque deixaram de estar 'in' e nunca quer estar 'out'. Ou da Marlene Carina, que não acabou o Liceu porque é uma bruta natural mas que culpa o 'stor' porque afinal ela até sabia e - vejam, vejam - até tinha jeito para os computadores e sabe carregar no botão do rato.
O Blog foi o primeiro mito a cair.
O segundo mito a cair foi o do Alentejo.
O Alentejo, ao contrário do que se diz, não é vermelho. Nem rosa. E seguramente não é laranja. O Alentejo é amarelo. No Verão. E verde. No Inverno. Será que ninguém tem olhos na cara para ver isso? O Alentejo é, à vez, amarelo e verde, porra.
Só o terceiro mito resiste. É o último. Resiste como a aldeia dos outros. E resistirá sempre. O último mito não caíu. Nem vai caír. O último mito sou eu. EU!
AR

sábado, agosto 16, 2003

Aviso à navegação

Criou-se um mito: o de que este seria um blog alentejano. Cumpre pois informar que apenas um dos três mentores d'A Quinta Coluna sentiu a misteriosa necessidade de comprar casa num povoado rural com nome de bagaceira, algures a Sul do Tejo.
Os outros dois mantêm quer a sanidade mental, quer a residência no distrito de Lisboa.
LR
zardoz@sapo.pt

quinta-feira, agosto 14, 2003

Sonho numa noite de verão

Abro os olhos, estremunhado. A cerveja do meu copo, abandonada despreocupadamente numa pequena mesa perto do sofá, borbulha ainda. Na televisão um pinguim fala. Um pinguim fala .... hummm ... fala?!
Parece-me ser um belo pinguim imperador, de fartas sobrancelhas, alto, talvez mesmo grande. Fala descontraidamente para um, vários microfones. 'Os fogos,... tal, tal, tal... os aviões, tal, tal, tal. Hmmm, Hmmm'. O pinguim dá a volta, afasta-se, e segue-o um séquito imenso de pinguins mais pequenos. Filas e filas de pinguins mais pequenos. Alguns pretendem-se também pinguins imperadores e desejam secretamente tomar, um dia, o lugar do grande pinguim e falarem, eles, aos microfones. Outros, mais humildes, aceitam a sua condição de pinguins de menor casta. Não serão, seguramente, imperadores. Mas talvez mandem no seu condado, na sua quinta, no seu quintal. 'Os fogos ... os fogos ...' Pinguins apressados passam, correndo, na televisão. Arrastam mangueiras, gritam insultos, choram lágrimas de pinguim porque perderam tudo, tudo.
Pisco suavemente os olhos, enquanto estendo indolentemente a mão para o copo da cerveja. Tenho sede. Está calor. A cerveja ainda borbulha, embora já quase não esteja fresca. Que calor. Outros pinguins passam, meteoricamente, pela minha televisão. Que raio! Onde está o comando? Não quero ver mais o programa, ainda por cima sobre pinguins. Tropeço, desequilibro-me e caio, ataboalhadamente, por cima da mesa onde repousa o meu copo de cerveja, que se mantém, por obra do acaso, impávido.
Sento-me novamente no sofá. Não encontrei o comando. Os pinguins, os pinguins.
Agora falam de não sei quê ... ajuda ... será ajuda? Talvez. Um pinguim diz que vai ser dada ajuda ... hmmm ... Outro pinguim diz que não acredita. Vários pinguins sentam-se à volta de uma mesa e discutem, acaloradamente, sobre a culpa do pinguim imperador nisto tudo. Sim, senhor, é um malandro, não ligou. Não, senhor, não é nada. Os outros antes é que foram. Não fizeram, e tal, tal, tal.
Bocejo.
A conversa dos pinguins aborrece-me de morte.
Tenho tanto calor.
AR

sexo

Ó camarada AR, bem sabes que eu sou adepto do sexo inseguro.
CC

A propósito do Dogma

Devo confessar que não tenho qualquer predilecção pelas grandes religiões monoteístas, o que me liberta para tecer considerações descomprometidas.
Neste caso, não resisto a comentar a última intervenção do meu amigo CC, a propósito do feriado do 15 de Agosto e do Dogma da Assunção de Maria ao Céu.
Eu tenho muita dificuldade em compreender o cristianismo e a sua teologia. Primeiro, porque a ideia de um Deus hermafrodita, que se cria a si próprio, não necessita de uma deusa para ter um filho, que é pai de si mesmo porque é o seu próprio filho e, para além disso, é espírito que ilumina os outros dois, que são ele próprio e que, portanto, se ilumina a si próprio, é algo que me deixa deveras perplexo (para já não falar nas questões éticas e morais que se levantam com esta confusão de paternidades ...). Segundo, porque sendo Deus, aparentemente, hermafrodita, não compreendo a necessidade da existência de Maria na mitologia cristã. Porque afinal, Deus não precisava dela. Já tinha feito o trabalhinho todo, não é?
Parece-me também, que a história da assunção, seja a do filho do pai seja a da mãe do filho do pai dá um jeito danado, porque assim quem viesse a seguir nunca poderia investigar se eles tinham existido mesmo, já que se foram embora e portanto não deixaram rasto neste mundo. Pois ....
A não ser que Maria seja, afinal, a cristianização da parte feminina da divindade. Eu explico. As religiões pré-cristãs tinham a sua dose de deuses e deusas, o que estava muito bem porque assim sabia-se mais ou menos como é que eles íam aparecendo, porque eram mais ou menos filhos uns dos outros. Nas tradições celtas que se perpetuaram até hoje sob os mais diversos disfarces, existe um Deus e uma Deusa, sendo que a Deusa foi sempre mais importante do que o Deus (que aliás morre a certa altura para renascer a seguir, o que significa que essa história de Jesus ter derrotado a morte de vez tem muito que se lhe diga, mas passemos adiante ...). Parece-me (desculpem-me os cristãos) que Maria não é mais do que a adaptação da figura da Deusa pré-cristã, que era ao mesmo tempo mãe e jovem (enfim, vai envelhecendo segundo o ciclo da lua, mas ignoremos agora esse pormenor para facilitar a fluidez do raciocínio). Pelo que não me entusiasma particularmente esta questão da assunção.
E fica por aqui a questão teológica.
Quanto ao feriado. Bom, eu gosto muito do feriado. E apesar de religiosamente ele não me dizer nada, concordo com ele porque de mais um dia de descanso se trata. Aliás, e considerando que o Estado português deixou de há muito de ser 'oficialmente' católico, exorto daqui os nossos governantes a incluirem no nosso calendário as celebração judaicas e muçulmanas. Com os respectivos feriados, claro.
Finalmente, também acho que a igreja foi, durante muitos centos de anos um travão ao progresso da humanidade e prejudicial à liberdade do indivíduo. Foi, ponto final. Em caso de dúvida, perguntemos a um senhor chamado Galileu (só para exemplo, claro!). E se tivesse hoje a força que teve noutros tempos sê-lo-ía também. Vemos isso diariamente em questões tão diferentes como o sexo seguro ou os progressos da medicina e da ciência na área da investigação genética e da clonagem.
Cumprimentos.
AR

já o tiraram da gaveta?

Os meninos do PS estão muito divertidos com a notícia de que está em formação um Partido Monárquico de esquerda e chamam-lhe «objecto político não-identificado». Acham que tem um ideário político confuso.
Essa é boa! Então o Partido dos meninos não se chama (ainda) «Socialista»?
CC

amanhã é feriado

Pois é, amanhã é dia 15 de Agosto, dia da Assunção de Nossa Senhora.
Com esta solenidade, a Igreja celebra a realização do mistério pascal em Maria. Sendo ela a «cheia de graça», quis o Pai associá-la à ressurreição de Cristo. A glória de Maria é a coroação de uma vida de amor e doação.
A festa da Assunção da Virgem Maria traz aos crentes motivos de alegria e esperança, pois nela já se realizou o que para a Igreja está por vir. Maria simboliza a Igreja que, mesmo em dificuldades, sabe que sua vitória é certa em Jesus Cristo. O sinal da vitória definitiva de Jesus é a ressurreição, pois vence de vez a morte. A Assunção de Maria mostra que o caminho da ressurreição já está aberto para nós, pois nela isso já se realizou.
A proclamação deste dogma da Assunção de Maria ao Céu, em 1 de Novembro de 1950, pelo Papa Pio XII, não é mais do que o reconhecimento das grandes coisas que o Senhor realizou nela e que, para o Povo de Deus, guiado pela Revelação, já era uma certeza de fé: que a Mãe de Cristo foi associada à vitória do Filho sobre a morte. Daí que, desde sempre, tenha venerado Nossa Senhora da Assunção na glória em alma e corpo.
Por essa razão, é feriado nacional.

Ora, exorto daqui aqueles que entendem que a Igreja não é mais que um travão ao progresso da humanidade e «prejudicial para a felicidade e liberdade das pessoas e, por acréscimo, para o bem comum» a irem TRABALHAR amanhã!

A todos desejo uma boa festa da Assunção.
CC

uns morrem...

Parece que o Maranhão vai suicidar-se. A ser verdade, acaba o melhor blog regional de Avis. Triste sina, esta de alguns alentejanos. É pena.

Entretanto, a Avis Linda revela-se ser um colectivo (feminino?), com comida vegetariana e poesia (feminina).
Há vida em Avis.
CC

quarta-feira, agosto 13, 2003

obrigado, Sara

... por me teres apresentado o Raduan Nassar, graças a quem ultrapassei o meu preconceito para com a literatura brasileira e que me abriu o olhar para um universo literário que, injustamente, ignorava. A inteligente escrita de Nassar é uma bomba de poesia em forma de prosa. Uma revelação.
Para quem não saiba, Raduan Nassar abandonou a escrita depois da criação de três obras ímpares na literatura lusófona. Apenas publicou dois romances, Lavoura Arcaica, em 1975, e Um Copo de Cólera, em 1978; e um livro de contos, Menina A Caminho, em 1997 (publicados em Portugal pela Relógio d'Água).
Depois de ler Raduan Nassar, resignei-me à minha condição de leitor e caíram por terra quaisquer aspirações, por mais humildes que fossem, de vir a escrever algo que considerasse ser literatura.
Ficam aqui dois contos para incentivar a leitura dos romances e para subverter o conceito de "literatura de férias": Hoje de Madrugada (lembras-te, Sara, de me teres mostrado este conto numa livraria?) e O Ventre Seco.
Boas leituras.
CC

lá para Outubro

Obrigado Maranhão.
Sim, lá para Outubro - data a partir da qual estarei com mais regularidade na Aldeia Velha - havemos de fazer um Congresso da Blogosfera Avisense.
Já há mais blogues com ligações a Avis que sítios onde tertuliar nesta terra: o teu, o meu, o do mestre, o do pedro, o do homem da piscina e o dela.
E ainda podemos convidar o Coruche, o albicastrense e os de Évora: o contra, o escritor e os heróis...
Bem sei que eu, o FJV e o MacGuffin não somos "regionais", mas sempre podemos ampliar o horizonte da conversa - eu até sou contra a regionalização.
Um abraço a todos.
CC

é hoje!

Já tinha saudades deste nervoso miudinho das quartas-feiras europeias.
Força, Glorioso!
CC

terça-feira, agosto 12, 2003

Polónia

Duas notas de viagem por terras polacas:

Auschwitz é apenas um lugar. Ao contrário do que reza a lenda, a relva cresce e é bem verde. No Bem ou no Mal, somos bem mais efémeros e transitórios do que gostaríamos de pensar.

"Os Quatro do Blindado e o Seu Cão" estäo editados em DVD!

LR
zardoz@sapo.pt

pobre...

...mas não mal agradecido.
Ainda não agradeci ao vizinho FJV a amabilidade que teve para com A Quinta Coluna. Aqui fica a vénia para um dos melhores espaços da blogosfera.
Prometo não o desiludir - ainda havemos de beber uma cerveja em Avis, enquanto falamos de livros, de música, de cinema, do amor, da vida, do universo e de tudo o mais.
CC

selvajaria

A Câmara Municipal de Borba resolveu destruir todos os ninhos das andorinhas que, há muitos anos, estavam alojados no edifício dos Paços do Concelho, assim violando, de uma só vez, legislação nacional (entre a qual disposições da Constituição), comunitária e a Convenção de Berna (Convenção Relativa à Conservação da Vida Selvagem e dos Habitats Naturais da Europa), aprovada por ratificação pelo Decreto-Lei nº 95/81, de 23 de Julho.
Recorde-se que, há cerca de três anos, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou o Estado Português pela destruição de 400 ninhos de andorinhas que estavam instalados na fachada do Tribunal de Nisa e pela instalação de dispositivos que visavam impedir as andorinhas de aí nidificar, bem como numa caução pecuniária compulsória, a favor de uma associação ambiental.
É sabido (não pelos responsáveis da C. M. Borba, que não sabem muita coisa) que a andorinha é uma espécie protegida e que, por essa razão, o Decreto-Lei nº 75/91, de 14 de Fevereiro (que transpôs as Directivas nº 79/409/CEE de 8 de Abril e 86/122/CEE, de 8 de Abril), proíbe expressamente, na alínea d) do artigo 5º, o acto de «destruir, danificar, colher ou deter os ninhos e ovos» das «aves selvagens que vivem em estado bravio em território nacional».
E o mais grave é que esta selvajaria acontece durante a estadia desta espécie em terras lusas – mas os autarcas de Borba não se lembraram de retirar os ninhos em Novembro, ou Dezembro. Não. Tinha de ser já...
Por outro lado, também se sabe que as andorinhas contribuem para o controlo das populações de insectos, já que uma família come mais de 200 mil insectos em apenas 20 dias. Prevê-se, assim, a distribuição de insecticida pelo (ir)responsável pelo pelouro do Ambiente naquele infeliz município.
Não há em Borba nenhuma associação que ponha esses selvagens em tribunal?
CC

a minha outra vida

Na Aldeia Velha também se ouve Lloyd Cole.
Music In a Foreign Language é um dos mais belos discos dos últimos anos.

Music in a foreign language
Words that we don't understand
Melodies won't come between us
And even if you wanted
We can't sing along

(Music in a Foreign Language)

Clearly you can see that I am bleeding
Clearly you can see my clothes are torn
Clearly this demands an explanation
Only I can offer none

(My Other Life)

No longer waiting for my prayers to be answered
No longer waiting for my publisher's call
No longer charming in my reminiscence
Only immersed in a famed afterglow
Now the night's drawing in
I'm your unworthy friend
At the ungodly end
Of a lifetime

(Shelf Life)

CC

segunda-feira, agosto 11, 2003

coruche

coruche está mais perto e com mais interesse. Um blog regional que olha em seu redor. Com livros.
Um abraço, NG.
CC

Cardoso

O professor Cardoso teve honras públicas, no passado sábado. Bem merecidas.
Em Borba, o professor Cardoso é uma espécie de personagem de um livro de Gabriel Garcia Marquez. Cego de nascença, dotado de uma extraordinária capacidade intelectual e com uma actividade cívica invulgar, ainda mais evidente numa terra onde quase tudo parece adormecido, foi professor de português e de francês da maior parte dos actuais borbenses. É uma figura muito popular em Borba e em Estremoz.
O professor Cardoso é um clássico. Cultiva uma nobreza de carácter, aliada a uma certa altivez de temperamento e a uma rígida formação moral. A fina e inteligente ironia do professor Cardoso é um modo natural de se expressar em qualquer meio em que se mova. A sua conduta prática é uma manifestação da dignidade do ser humano, livre e empenhado. Com causas e sem medos.
A sua presença na Assembleia Municipal de Borba (AMB), como eleito da CDU, configura um caso típico da expressão latina margaritas ante porcos. Isto porque, depois da primeira frase do professor Cardoso, a quase totalidade dos restantes membros da AMB já não compreende o que está a ser dito: não só porque estes autarcas têm um vocabulário bastante reduzido, como também porque não alcançam um pensamento que seja um pouco mais complexo do que um diálogo de telenovela.
E o professor Cardoso nunca facilita. Eleva o debate do local para o global, contextualiza os factos em discussão, e fundamenta as suas opções com um pensamento lógico, filosofica e ideologicamente sustentado. Cita autores portugueses de cor, adaptando as frases ao contexto da contenda argumentativa e, com isso, deixa exasperados os pobres de espírito dos autarcas, cujo triste ego incha com demasiada facilidade.
Convenhamos: é um feito ser cego e, ainda assim, ser rei.
Parabéns, Cardoso. Bebo uma cerveja consigo.
CC

domingo, agosto 10, 2003

tempos que correm - fim da polémica

Umas notas finais para o fim da "questão Ratzinger", com MVA:
1) Ainda bem que concordamos, ambos, com a liberdade de pensamento e da consequente liberdade de expressão desse pensamento - seja ele qual for, acrescento eu;
2) Tudo – mas mesmo tudo – merece a dignidade de ser pensado e discutido. Mesmo “os direitos e liberdades constitucionalmente definidos”, seja para melhor os concretizar, seja para lhes ampliar o campo de aplicação, seja para os redefinir;
3) As tendências sexuais (chamemos-lhe assim) não são "opções" de cada indivíduo (aqui concordo em absoluto com MVA). Não sei por que razão sou heterossexual, mas não o sou por “opção” minha.
4) Por maioria de razão, mesmo os “direitos dos e das homossexuais” podem e devem ser discutidos: terão os homossexuais, outros direitos, novos direitos, face aos heterossexuais? E em que medida? E quem os definirá? E se implicarem limitação de outros direitos de terceiros (as crianças a adoptar por casais homossexuais), como os compatibilizar?

Por último, digo a MVA que, já não sendo crente (ou atravessando uma grave crise de fé), tenho a certeza absoluta que, sem a presença da Igreja Católica, com os seus muitos erros e defeitos, passados e presentes, o mundo seria um local mais pobre, triste e selvagem.
Tenho, aliás, a profunda convicção que é precisamente a falta de influência do pensamento da Igreja no seio das sociedades contemporâneas um dos nossos maiores problemas. E, do mesmo modo, é a desadequada comunicação por parte da Igreja aos homens de hoje uma das causas da desumanização das comunidades, com reflexos directos ao nível da política e da economia. O neoliberalismo, por exemplo, é uma nefasta consequência do vazio deixado pelo pensamento e filosofias de matriz católica.

E, acredite-me, MVA, nunca encontrei outro local onde houvesse tanta liberdade de pensamento como na Igreja. Nem nas organizações de esquerda, por onde passei – e continuo a pertencer afectiva e ideologicamente – encontrei tanta liberdade: aqui também há demasiado “pensamento único”.

Um abraço.
CC

sábado, agosto 09, 2003

obrigado

cumprimentos ao Pulha da Net!
CC

mais polémica

Nunca pensei em defender Ratzinger, mas nunca se pode dizer «desta água não beberei».
Miguel Vale de Almeida, novamente aqui, replica à minha resposta. Eu trepliquei.
Ficam aqui os registos:

O de MVA:
«Mais Ratzinger
O comentário de CC merece um contra-comentário. O problema quer da teologia, quer das notas emitidas pelo Estado da Santa Sé, sede da ICAR, é que usa argumentação com aparência lógica e racional mas (e o "mas" faz toda a diferença) construída sobre premissas ilógicas e irracionais. A saber, as da formação divina do mundo e as do diretio natural, entre outras. O direito natural é o que tecnicamente se chama um oxímoro, uma contradição nos termos: é que, sendo o direito uma instituição social e humana, um conjunto de convenções, não pertence à natureza nem precede a socialidade humana. Só é possível não pensar assim se se acreditar numa criação divina do mundo, da natureza, da humanidade, ou, alternativamente, num qualquer determinismo biológico. Cada qual é livre de acreditar no que quiser, desde que não o imponha aos outros. Mas quando se chega ao debate sobre as regras da vida em sociedade, temos que usar a mesma sintaxe, para então podermos esgrimir semânticas diferentes. Ratzinger não pode basear os seus argumentos no direito natural e na criação divina do mundo para os efeitos da discussão em causa. Senão é o mesmo que aceitar como válido o argumento de alguém que diz que não quer e não aceita uma coisa apenas porque a acha "feia", de "mau gosto" ou porque "não é assim que se faz e sempre se fez assado".

PS: Não só li, e bem, o texto de Ratzinger, como o exercício foi penoso. Ainda pensei em rir-me a dado momento, mas falhou-me o sentido de humor quando me apercebi que a influência da ICAR pode ser directamente prejudicial para a felicidade e liberdade das pessoas e, por acréscimo, para o bem comum. Não será por acaso que o cardeal ocupa um lugar que é herdeiro da Inquisição...»


O meu:
«Meu caro MVA:
Continuo sem perceber por que razão uma voz da Igreja (institucional, ao seu mais alto nível) "não pode basear os seus argumentos no direito natural e na criação divina do mundo para os efeitos da discussão em causa". Não pode, porquê, se essa premissa faz parte da essência da sua doutrina?
Por essa ordem de ideias, os comunistas "não podem", num qualquer debate, usar de argumentos em que esteja implícita a luta de classes...
E "não podem" porquê, MVA? Porque não lhe agrada? Ou porque isso perturba o seu olhar do mundo, despojado (diria "liberto"?) de Deus?

Quanto ao "direito natural", conceito discutido desde a Antiguidade, não está necessariamente ligado à existência de uma referência divina - há autores e pensadores jurídicos, inseridos na escola jusnaturalista, que não são crentes. As suas premissas são de outra ordem: a natureza humana, os direitos do homem, uma ética mínima que se prende com a dignidade inerente a cada ser humano.
MVA pode também não aceitar esta premissa. Sartre dizia que «não há uma natureza humana, porque não há um Deus para a conceber». O que MVA "não pode" (fica-lhe mal, como intelectual que é, com as inerentes responsabilidades) é recusar-se que outros usem premissas argumentativas que são fundadoras do seu pensamento e da sua visão - filosófica, ideológica ou religiosa - do mundo.
Um abraço.
CC»

CC

sexta-feira, agosto 08, 2003

resposta a Miguel Vale de Almeida

Diz Miguel Vale de Almeida: «a nota negativa a sério deve ir para o Inquisidor-Mor da Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR), Cardeal Ratzinger. A recente divulgação de posiçoes contra uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo é um texto jesuiticamente absurdo. A suposta preocupação com a sociedade e a família, argumentada numa retórica que pretende ser racional, baseia-se, afinal, em irracionalidades como "direito natural" e "criação divina". Não quero falar nem de liberdade religiosa nem de fé. Aceito a primeira e percebo a segunda, enquanto antropólogo. Mas como cidadão, acho que é altura de tornar a dizer "basta" a estes absurdos (como o tentaram fazer iluministas, jacobinos, republicanos e marxistas). Não através da proibição e da perseguição, mas através da distinção clara entre o que é a coisa pública e o que são as igrejas. Não se pode, simplesmente, dialogar a sério com quem apresenta os seus argumentos sobre bases incompatíveis com aquelas com que a coisa pública se organiza. Acho que as coisas boas da religião (na opinião dos crentes), como a ética, certos valores, etc., existem também no universo da ética laica. Não acresentam nada que este não tenha. Mas que dizer das coisas que considero más - como a irracionalidade, a explicação divina de coisas que se explicam social e historicamente, ou o dogmatismo? São inadmissíveis, porque retiram liberdade às pessoas, tolhem a sua inteligência e reprimem o exercício de direitos - exercício esse que não poria em causa de modo algum os direitos de outros. (...) Quando Ratzinger diz o que diz sobre homossexualidade, ele nã está a manifestar uma posição de fé, neutra e equivalente a tantas outras opiniões. Está, isso sim, a promover a exclusão (com alguns truques retóricos sobre a "tolerância" face aos homossexuais) e isso é inadmissível numa sociedade baseada nos direitos humanos - e não em qualquer absurdo, irracional e obscurantista "direito natural"».

Respondi-lhe isto:
«Caro MVA
Sabemos que o recurso da argumentação ad hominem é próprio de quem lhe falta outro tipo de pensamento, mas, como sei que não é o caso, tomo a liberdade de me reportar ao pouco que resta deste post.
Na ânsia de rebater argumentos de que não gosta, parece esquecer de os ler.
Por que razão é o direito natural uma "irracionalidade"? E a ética e a moral, quando diferem da sua, também o são? E, se sim, há também que lhes dizer "basta"? E como? Coartando-lhes a liberdade de expressão? (Parece-me que há mais inquisidores do que parece à primeira vista.)
V. Exa., por quem tenho alguma admiração intelectual (e com quem até já almocei, numa esplanada do Funchal) - permita-me que o diga - não leu o texto que pretende rebater.
Aconselho a sua leitura aqui, por exemplo, e depois - mas só depois - uma resposta ao que lá vem escrito - e não ao que não está lá.
Obrigado.
CC»

Fica aqui o registo.
CC

quinta-feira, agosto 07, 2003

time is against me now

Meia idade: já tenho mais passado que futuro.
CC

quarta-feira, agosto 06, 2003

monólogo completo

Ele gosta tanto da rapariga que lhe envia fotografias dela própria.
CC

diálogo completo II

Ela: Nestas noites quentes, gosto muito de dormir na minha cama de casal. Estendo-me a toda a largura da cama. Até tenho duas almofadas, que vou alternando, para me refrescar.
Ele: Também durmo sozinho numa cama de casal, com duas almofadas. Gosto de mudar para o lado mais fresco da cama, conforme vai ficando quente o lado em que estou.
Ela: Pois, é muito bom. Queres dormir comigo?
CC

terça-feira, agosto 05, 2003

diálogo completo

Ele: Gosto muito de passear sozinho na praia, ao fim da tarde.
Ela: Eu também. Gosto de me isolar e caminhar à beira-mar, sem ninguém por perto.
Ele: Perfeito! Por que não vamos juntos?
CC

segunda-feira, agosto 04, 2003

Sarna para me coçar

Os filmes mais irritantes da História do cinema:
1) A Barreira Invisível (Terrence Malick) (1998);
2) O Piano (Jane Campion) (1993);
3) Venus Velvet (Jorge Cramez) (curta - 2002).
CC

desamparo

Já não bastava o abandono de Deus
- e ainda Portugal está um inferno.
CC

Deixa-me dar-te o verão

O verão é feito de coisas
que não precisam de nome
um passeio de automóvel pela costa
o tempo incalculável de uma presença
o sofrimento que nos faz contar
um por um os peixes do tanque
e abandoná-los depressa
às suas voltas escuras


José Tolentino Mendonça

CC

sexta-feira, agosto 01, 2003

os melhores (de visu et auditu)

1) 2001 - Odisseia no Espaço (Stanley Kubrick) (1968);
2) O Sacrifício (Andrej Tarkovsky) (1986);
3) Uma Questão de Confiança (Hal Hartley) (1990).

Este ano (so far):
1) A Última Hora (Spike Lee);
2) Longe do Paraíso (Todd Haynes);
3) Vai e Vem (César Monteiro).

CC


Fogo posto

E tudo em mim é um fogo posto
Chamas que me queimam, altaneiras
Mantidas por um corpo sem rosto
Que me consomem de mil maneiras

Chamas, calor, inferno. É sofrer
Por ti, Ofélia, infinita dor
Do receio perene de perder
A sombra querida de teu amor.

Olho estas chamas sem remédio
Qual monstro hediondo, sem rosto
Que destrói meu sonho etéreo

Para acordar, seco e brusco
Imerso em vagas de tédio
Pois tudo em mim é um fogo posto.

/AR

Food for thought

Os três piores filmes da História são, por esta ordem:

1) Matrix
2) Blade Runner
3) O Carteiro de Pablo Neruda

zardoz@sapo.pt

Pívea

Para Ti Maria

De Bragança a Lisboa são 6 horas de caminho

Estava a masturbar-me já nem sei porquê. Era uma casa-de-banho pública razoavelmente limpa e como as coisas estavam a correr parece-me que iria continuar a sê-lo. Tudo indicava que não iria conseguir ser feliz nos meus intentos. Estava tudo demasiado desfocado e surreal para que eu antingisse um mínimo de concentração necessário. Tinha ido lá não sei com quem ou era a festa de anos de não sei o quê. Havia muito ruído de fundo e muito descontrolo motor de perto. Assim como se fosse outra pessoa a fazê-lo. Alguém inexperiente e/ou desajeitado. Tinha a mão esquerda apoiada na parede e os rastos de suor que deixava nos azulejos sempre que a deslocava um pouco pareciam-me infinitamente mais interessantes do que tentar concentrar-me nas mamas da fulana que se fartaram de me dizer olá na pista. Nem sem bem como é que era a cara da gaja e por muito que tentasse acho que não iria saber. Mas não faz mal, se calhar nem dentes tinha. Posso sempre pegar noutra cara e pô-la nas mamas. E pegar numa voz e pô-la na cara. Aquela rapariga horrorosamente simpática lá do escritório por exemplo. Tem uma voz tão sexy que podia fazer fortuna a vender sexo verbal. Uh ah give it to me baby. Ai, que bela é a vida. Aqui há uns anos nunca teria tomates para fazer uma coisa destas e agora não tenho picha. E isso ainda me diverte. Como me diverte o facto de não saber se este cubículo tem fecho e em caso afirmativo não saber se o utilizei. Aquela coisa que faz anos é muito esquisita. Zilda? Zelda? Que raio de pseudo-amigas pseudo-intelectualmente interessantes que aquele gajo me tenta arranjar. Se calhar ando com a fasquia muito alta. Não metaforicamente, claro está, pois nesse campo isto parece estar a murchar. Para a próxima vou reduzir o meu leque de condições: que seja grátis e que sejam limpinhas. Não é pedir muito pois não? Sei de muito boa gente que diz não ser esquisita e que exige pernas, braços ou mesmo luxos como depilação feita ou o pior de tudo: meio palminho de cara. Pronto, eu também prefiro quando elas não têm picha, chamem-me antiquado. Todas diferentes, todas iguais. E umas mais iguais que outras. “és divertido” disseram-me as mamas na pista, ao que eu fantasiei retorquir “isso significa que posso ejacular dentro de ti?” quando na realidade disse “tenho que ir mijar”. O.k. nem sequer foi assim porque eu sou um educadinho de merda e o que eu provavelmente disse foi “com sua licença minha senhora, vou-me ausentar por uns momentos”. Tudo culpa do meu tio Joseph Lopes, um luso-britânico de gema, se é que isso existe, que me criou desde os 2 anos e meio. Eu acho que ele nunca percebeu que esse pessoal do norte da europa é muito educadinho porque têm umas pichotas de trazer por casa. E lixou-me a vida para sempre. Toda a gente sabe que um gajo educadinho não leva nada, nem sobras, nem um pintelhinho para mostrar aos netos. Eu bem que podia ter a maior pila do mundo e só me iria servir para morrer estrangulado durante o sono.
Britney Spears. Estão a passar Britney Spears. Devia haver leis para estas merdas. Como é que é suposto um gajo vir-se se a imagem daquela ninfeta siliconada se forma neste pequeno cérebro. Aquela lolita mal-amanhada de umbigo em riste está-me a desgraçar o esquema todo. Por amor de Deus, até com os Village People conseguiria (acho), mas assim não dá.
Niente, nada, rien. Nem um esguichozito para amostra, para deixar a minha marca no mundo. Se tivesse uma caneta ainda poderia escrever algo infantilóide ou divertido ou um graffiti porco pujante da virilidade que me parece faltar.
Tornar á pista ou não eis a questão.
“Olha, estás bem?” perguntaram-me as duas em uníssono, as gémeas bola. Ai, isto da tecnologia dá cabo de um gajo. Com estas cenas todas torna-se cada vez mais provável comer gato por lebre. What a Wonderbra World this could be. “Sim, estou. Estava imensa gente. Até cheguei a pensar que estava na bicha para a casa de banho das senhoras”. Começam-se a rir as duas “És mesmo divertido”. “Voces também” apeteceu-me responder, mas optei por “Apetece-te tomar algo?”, o que me levou directamente para o anúncio da Ferrero Rocher, ao ambrósio e à condessa, aos chocolates e à anedota. “Sim, um Gin Tónico, querido”. Querido? Ao que o mundo chegou. Acabou de me conhecer e já me chama querido. Nem sequer fez nada de significativo por mim, tipo simular uns orgasmositos para sossegar o meu ego ou fazer-me uns ovitos com bacon. “Volto já. Não saiam daqui”. Ela olhou perplexa e eu corrigi a rir-me “Não saias daqui. Já devo estar a ver a dobrar...” Que lapsus linguae genial. Quando tinha 17 anos o meu primo Afonso que é um malandro de primeira convenceu-me que um lapsus linguae era quando no furor de um cunnilingus se enfiava, acidentalmente, a língua no ânus da senhora. Pelo que durante alguns anos, não vou dizer quantos, tive sempre imenso cuidado para não cometer um tal lapso. Claro que depois de conhecer a Maria, as coisas mudaram. Oh! Boy, se mudaram! A terra deixou de ser plana e até o sol deixou de girar em torno dela. Eu sabia o abc, mas a Maria levou-me para aí até ao w. E o que foi feito de ti?
“SÃO 2 GIIINS TÓNICOS”. “Não é preciso gritar” respondeu-me secamente a Barwoman. Pelo que corei q.b. e pedi desculpa. “Aqui estão elas, quer dizer eles” disse estendendo um copo na direcção das volumosas manas. Elas continuavam imponentes e eu sabia que iria travar um contacto muito pouco fraterno a curto prazo com elas. “Como conheces-te a Zélia?” Quem é a Zélia? Ah! A coisa que faz anos “ Foi através do Carlos”. Fiquei com a Maria atravessada. Já há muito tempo que não me acontecia. Se calhar podia procurá-la. Já passou tempo suficiente. Ou talvez não. Entretanto as glândulas da minha eleição, futura perdição, encostaram-se ao meu torso e pressionaram-me com suavidade. Eu já devia estar com pouco sangue no álcool porque pareceu-me ver dois mamilos bem erectos a dizerem-me olá. E frio não estava. Podia ser só uma reacção mecânica. Um adolescente até é capaz de ficar com pau de levar uma bolada em cheio nas partes. Sorriso. Claro que agora até podia ser pino de bowling. “Estás a rir-te de quê?” perguntaram-me as minhas novas amigas. “De nada. É que sou tão divertido que me divirto a mim próprio” expliquei-lhe. O que me remeteu instantaneamente para o meu pequeno faux pax no W.C.. Não, o meu primo Afonso nunca inventou nada sobre este assunto. “Se queres mesmo saber estou a rir-me do facto do Carlos ter tentado impingir-me a Zélia”. Novo ataque das ogivas, já armadas, não deixavam espaço para dúvidas. “Mereces muito mais”. Que putice do caraças. Com amigas assim quem precisa de inimigos? Decidi olhar para a cara dela. Até nem estava nada mal. Ao contrário de mim que já deveria estar num estado deplorável. Até me ocorreu voltar à casa de banho e tentar outra vez. E podia pedir uma caneta emprestada, só pelo seguro. “Por ser divertido?” inquiri. “Isso e cavalheiro e se me permites a ousadia bastante charmoso”. Game, Set and Match. Eu deixaria a parte do cavalheiro para quando lhe prometesse não me vir na boca dela, mas enfim sabe sempre bem. Ouvir estas coisas, quero eu dizer. “Muito obrigado. Mas por certo nada que se compare à beleza e ao charme da minha companhia”. “Oh, achas mesmo?”. Ai, Jesus que lá vou eu. Quando era mais novo gostava mais deste jogo, de cantar a canção do bandido, da conversinha de ir ao cú. “ Sim, reparei logo em ti no jantar. Achei-te imensamente atraente. Daquelas coisas inexplicáveis, à primeira vista”.
Chamam-se mamas e andam aos pares. E não têm nada de especial a não ser que se tenha o azar de ser do sexo masculino e idade para ler o Tin-tin. “Sabes, eu também reparei em ti e perguntei logo quem eras”. Grand Slam. Quem disse que os 18 buracos do golfe eram o melhor remédio para o stress do quotidiano? Ninguém provavelmente. Mas houve um amigo meu que me disse que o caminho para o céu passava pelo meio das pernas de uma mulher. Mas também, ele era jovem e nunca devia ter apanhado um dia de céu muito nublado. “E o que é que te disseram?” indaguei sem qualquer interesse real. Agora, já estava. Já não tinha interesse. Era como se fosse uma ejaculação precoce do foro psíquico. Antes de o ser já o era. Talvez também não fosse cem por cento assim. Afinal de contas ia gostar de vê-las a actuar juntas e ao vivo. “Que eras o Mark, amigo do Carlos e trabalhavas numa editora”. Sim, mas que interessante. “Eu é que não sei o teu nome”. E nem queria saber, mas o meu tio Joseph deu cabo de mim. E, convenhamos, há um mínimo. E elas gostam sempre que se grite e/ou sussurre o nome delas. Desde que não nos enganemos, claro. “Eu sou a Márcia”. Que porra de dia, é só nomes esquisitos, devem ser todas jogadoras de futebol. Nem dá para rimas porcas. Ó Márcia brinca aqui com a Acácia não tem lá muita piada “Que nome tão bonito e invulgar”. Os teus pais não gostavam de ti? E as duas irmãs como se chamam? E porque é que não és a Maria?
“Queres ir?” Como se eu não soubesse. “Sim, tens carro?” “Aqui não, vim com o Carlos” “Vamos no meu, então” Começamos a percorrer a minha Lisboa em direcção ao Rêgo. Sim, esse facto até me divertiu a princípio. Passámos por uma limosine e eu tive mais uns flashes do ambrósio, da condessa e do busto de napoleão. Falámos de coisas altamente contraceptivas como o trabalho, a vida, o amor e o último disco do Sérgio Godinho. Se o Sérgio soubesse a percentagem de gajas que gosta dos discos dele metia os Iglesias todos juntos nos distritais.
Apesar de estar completamente toldado fiquei gelado quando me apercebi que estava a entrar no prédio da Maria. Disparate, ela já nem deve morar aqui. Não me digas que a Marciana comprou o apartamento dela. Ou alugou. Ou vivem juntas. Tudo é possível, afinal de contas hoje já estive a masturbar-me numa casa de banho pública. Mas não. É noutro andar. Deus existe. Tem sentido de humor, mas existe.
“Queres um café? Estás um pouco lívido”. Que merda é esta, sou um homem ou um roedor? “Não, obrigado. Chega cá”. Ela gaguejou um pouco e disse “Desculpa a desarrumação, gostava que soubésses que nunca fiz isto assim na primeira vez e...” Ok. Agora vai dizer-me que é virgem ou quase como se fosse e que só depois de conhecer e ser aprovado pelos progenitores é que posso desfrutar das montanhas e vales de Marte. “Eu compreendo. Também nunca tinha sentido isto assim tão forte à primeira vista e..” andam aos pares, normalmente bem aconchegadas e já davam cabo da vida ao homo erectus. Que ainda deveria ser o nome da nossa espécie, pois de sapiens só temos as fêmeas. O meu tio bem dizia para nunca subestimar a cabecinha (não por estas palavras), nessa altura já transmutada em besta encapuçada. “Sim Marky, sim”. Wham Bam thank you mam.

**************

Eram sete e meia da manhã. Bati à porta suavemente. Depois com mais força. “Quem é?”. Era ela. E ainda fazia disparar o meu coração. “Sou eu”. Tinha uma camisa de noite que eu não conhecia. Com patinhos. Mas também podiam ser gansos. Ou mesmo cisnes. Olhou-me nos olhos. “Cheiras a sexo”. Desatei a chorar como uma criança. Convulsiva e incontrolavelmente. “Desculpa, eu...”. Deu-me a mão e levou-me para o sofá da sala. “Pronto, sossega”, “já passou, já passou”, “tem calma, pronto, pronto”. Fazia-me festas na cara e no cabelo e lutava estoicamente contra as lágrimas que continuavam a escorrer. As minhas e as dela. Era a Maria contra o dilúvio. E os homens não choram. Apertou-me contra ela. Eram patinhos. E o céu era ali.

Este é dedicado aos Xutos e ao Jorge Miguel. Um grande Bem Hajam (sempre quis escrever isto :-)
Paulo Miguel Teixeira
5h50m de 10 Julho de 2000

silêncios

Silence is sexy
Silence is sexy

So sexy
So sexy

Just your silence is not sexy at all
Just your silence is not sexy at all
Your silence is not sexy at all!


Einstürzende Neubauten

CC

Sugestão II

Sugiro também que dês títulos aos posts.
CC

Sugestão

Sugiro «a 5ª coluna».
CC

E agora?

1º de Agosto

E tudo em mim é um fogo posto.
CC

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